Nei Duclós
Foi de manhã que se soltaram todos
os laços cortados à noite. Voaste para bem alto e depois voltaste lentamente
para meu corpo.
Não quero te ferir, mas há o risco.
Sou feito de espinhos e tua natureza é a seda. O bom é que aprendeste a nobre arte de dar uns
murros. Assim nos mantemos em sintonia vigiada, belíssima.
Se quiser distância nem sequer
tropece. Porque terás retaliação do teu objeto sem freio.
Não se aproxime do urso se ele
estiver solto. Melhor ficar no conforto da tua gana remota.
Sei de onde tiro meu assíduo assédio
sobre nosso jogo de pega e larga: das curvas que sugeres de longe, traiçoeira
enjaulada.
Poesia é quando acordo com teu olhar
saciado mas ainda guloso enquanto o amanhecer doura tuas rendas sobre a cama
detonada.
Te acostumei à minha ausência.
Depois me queixo.
DIVIDIR
Somei nossos momentos. Ficamos
devendo.
Dividi tudo contigo. Disseste que
eram só palavras. Peguei de volta.
Encerrei o expediente. Agora, em vez
de poesia, contas.
O primeiro beijo é o primeiro
encontro. O que veio antes não conta.
Estava passando aqui perto e lembrei
que estavas longe.
Tenho até medo de dizer, mas o que
sinto está ganhando um corpo físico, feito de nossos apertos em cantos, som de
grudes, estalos de pêssegos, doce escorrendo. Parece loucura.
Foi tão perfeito que nos perguntamos
o que fazíamos antes disso e porque custamos tanto a experimentar esse encaixe
de íntimas sintonias
Puseste tudo no caldeirão mas
esqueceste que és fada e o feitiço não funciona. És do sol, pátio luminoso da
Lua nova. A noite te beija, por minha encomenda.
Nada vale o que dizes não fosse o
mel que domina o coração ainda vivo.
Me chamas, me afogas, me acendes, me
queimas. Tudo em ti é labareda, vulcão na correnteza.
A Lua Nova é o que restou de um
mobile construído por algum deus com gana de seduzir a mais bela da terra.
Ficou esse pingente no céu que volta sempre que existe esperança de um novo
amor
Não posso mais abrir tua gaveta para
tirar de lá os versos que te dediquei. Eles pertencem ao amor perdido. Preciso
enxergar o que há de fervor na Lua Nova.
Fui deletando as mensagens como se
estivesse rasgando as tuas cartas. Até que cheguei à primeira vez em que me
disseste bom dia. Resolvi responder de novo.
RETORNO – Imagem desta edição: Rosie
Huntington-Whiteley.