10 de outubro de 2006

POR QUE NÃO HÁ PROPOSTAS?





Todo mundo escandalizado com a agressividade do debate-boca entre os dois candidatos da ditadura e a falta de propostas embutida nele. Como notou Fabio Konder Comparato na Folha, Lula e Alckmin, em rota de colisão, ameaçam o Brasil com uma tragédia. Não há propostas porque tudo se resume à política econômica. Aí ninguém mexe. Não se trata de opor desenvolvimentismo à estagnação. O que pega é opor política econômica do interesse do país com política econômica entreguista. A Argentina cresceu nove por cento, nós nem chegamos aos três por cento. Por quê? A Argentina (assim como outros países que cresceram) deram um pontapé na política econômica entreguista, coisa que nossos candidatos jamais fazem ou farão. Essa situação de caos se mantém porque há um consenso, na opinião implantada pela mídia, de que essa é a realidade que não deve mudar. Lendo alguns articulistas da área econômica, vemos o quanto são ferrenhos defensores da entrega do Brasil por meio dos juros escorchantes da dívida impagável, da globalização empresarial e de todo o arsenal que suga o suor da nação para levá-la, de bandeja, para a pirataria internacional. Os artigos debocham de qualquer aceno por algo fora de moda entre nós, a tal de soberania.

ESMOLAS - Como temos que trabalhar para os outros, então nada sobra para o que vivem citando, saúde, educação etc. Lula gastou dois bilhões e meio de reais em publicidade do seu governo e 700 milhões, só este ano, segundo Alckmin (e não foi contestado pelo oponente) em passagens e estadias para os afortunados do Estado em trânsito. Alckmin tem como consultores e aliados banqueiros e economistas de direita. O Brasil perde em todos os níveis com esse tipo de candidato. Um distribui esmolas em troca de voto, outro quer privatizar o Estado. Torcer por qualquer um deles é ajudar a cavar o buraco. Resta o voto útil, nome atual do velho voto de cabresto. O voto anti-Lula quer erradicar do poder a súcia que tomou conta de tudo. Na parada de ônibus, converso com uma funcionária pública. Ela diz que nunca viu coisa igual: todos os cargos, dos mais altos aos mais baixos, são ocupados pelos aliados do governo. Não há diversidade, não há critério técnico: é tudo aparelhamento da máquina pública. Com Alckmin possivelmente será a mesma coisa. Num país em que o governo tira tudo das atividades produtivas, para formar um bolo que vai cair nas fotos dos dossiês, fica difícil pensar em saídas para o sufoco.

BLOCO - Mas isso é muito simplório, costumam dizer. O importante é se sofisticado e pós-pós-pós moderno. O fato é que os desafios de hoje são os mesmos, em proporções diferentes, de décadas ou séculos atrás. Trata-se de inventar e consolidar uma nação, não deixar que coloquem a mão aqui, o que hoje é feito de maneira festiva e profunda. O que a China faz com essa situação é típica de país sem soberania. Encheram o mercado de porcarias produzidas por eles, e agora estão também fornecendo insumos para o que resta de nossas fábricas. Gargalham da nossa falta de noção e cuidam dos interesses deles. Vi um grupo de chineses no terminal de ônibus. Como eles riem! Como estão satisfeitos. Quando morava em São Paulo, trabalhando na Avenida Paulista, vi como todos os pequenos negócios ao redor daquela celebrada região caíram na mão de chineses ou coreanos. Eles atuam em bloco, cavando o lugar que deveria estar a cargo dos brasileiros. Mas o brasileiro não existe, todos são estrangeiros. No vale-tudo da política, não há nenhuma proposta para acabar com essa sacanagem. No fundo, adoram que sejamos o rabo do mundo.

LIÇÃO - Darcy Ribeiro dizia que o Brasil, quando for independente, iria libertar seus algozes dessa missão. O escravo que rompe as correntes libera o senhor de seu papel. Mas como somos um país de escravos, em que todo mundo pensa ser senhor (para escapar da escravidão), adoramos criar correntes. A pior delas é mental. Temos uma cultura de subserviência. É por isso que todo o sistema de rádio da Era Vargas era voltada para o interesse nacional. A música brasileira difundida maciçamente formou gerações de talentos que deslumbraram o mundo. Mas essa lição não foi aprendida. Hoje rebolamos, para que todos vejam como somos sexy.

RETORNO - Imagem de hoje: a Rádio Nacional, quando havia soberania no país (notem que não há ninguém se esforçando em ser sexy).

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