25 de julho de 2017

OS LIVROS NOS ESQUECEM



Nei Duclós

Sei de bibliotecas inteiras, acumuladas por pensadores brasileiros, que ficam em caixas esperando vez nas bibliotecas universitárias ou públicas. E de caixas e caixas de livros sem importância que o governo distribui para as escolas e que ficam atiradas em sua maioria em um canto qualquer. Em 40 anos de profissão, trabalhando por muito tempo na análise e divulgação de livros, acumulei uma quantidade enorme de exemplares, a maioria descartável, datada. Poucas preciosidades resistem ao tempo e podem ocupar o espaço escasso de que dispomos para eles. Tenho também meu acervo de livros que publiquei e continuam sendo vendidos aos poucos, num trabalho de formiguinha, para quem gosta e quer literatura.

Hoje, dia do escritor, há a admirável campanha de “esquecer” exemplares em determinados lugares para que as pessoas achem. Nada mais apropriado. O preço do livro impede que se tenha acesso a muita obra boa e certamente haverá, entre os esquecidos, títulos que merecem ser levados para casa e lidos. Já participei dessa campanha anos atrás. E Na Bienal do Livro do Rio em 2015 ditribuí uma caxa de livros para o público que compareceu ao grande evento, a maioria estudantes que naquela edição não tinham sido subsidiados para adquirir algum livro de sua preferência. Ficaram com o meu Refúgio do Príncipe, que é uma seleta de contos e crônicas que publiquei na imprensa e nos blogs.

Este ano cheguei a separar alguns exemplares para “esquecer” por aí, mas não achei pertinente. Primeiro, porque já participei nos outros anos (veja foto), com retorno zero. Quem acha e fica nem sempre está afim. Pega por curiosidade ou porque está dando sopa. “Não sou dessa coisa de ler” me disseram quando eu vendia meus livros no corpo a corpo com leitores em potencial (hoje não faço mais isso). Segundo, porque não é justo para quem tem comprado meus livros, não apenas os impressos, mas os ebooks. Pagar por um PDF é mais um ato de solidariedade do que outra coisa, mas tenho obtido boa repercussão nessa sintonia fina com leitores carinhosos e dedicados.

Faço como os músicos que se recusam a tocar por cerveja ou prestígio. Vendo livros, mesmo por um valor simbólico (normalmente não é), assim como tenho proposto receber uma remuneração por qualquer texto solicitado. A profissão de escritor não existe, mas eu insito nela desde que comecei a divulgar meu trabalho. Acredito que, de tanto serem esnobados, os livros acabarão nos esquecendo, nos deixando á mercê da barbárie. Em vez da sabedoria e da inspiração, o xingamento e a ruptura. É o que estamos vivendo. Falta leitura de livros bons. Nossos best-sellers são de uma infinita pobreza intelectual. Hoje fui na edícula no fundo do quintal onde guardo meus exemplares e lá capturei alguns autores da Biblioteca Miguel Lobato Duclós. Hegel, Plutarco, Schopenhauer. Perder tempo é não estudar filosofia. Ou não ler boa literatura.


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