11 de março de 2011

O FALSO CINEMA DA MISÉRIA


Não vi filme sobre a miséria americana que acabasse mal. O único que me assustou de verdade foi Deliverance (1972), de John Boorman. Ou o marginalizado filme de Hector Babenco , Ironweed, mas aí não vale, Babenco é argentin...digo, brasileiro. Mas o que tenho visto é sempre uma falsa abordagem. No fundo não é sobre miséria, mas redenção. Sobre miséria é Cidade de Deus ou Tropa de Elite. Nisso somos profissionais. Mas os americanos sempre dão um jeito de, sob o som sedutor do country ou do blues, fazer dos seus personagens arrebentados uma lição positiva de vida. Alguns se estropiam de verdade, mas nunca os protagonistas. Como acontece com Winter´s Bone (traduzido bregamente para Inverno na Alma), da diretora Debra Granik. Como filme é recente, aviso que este texto contém spoilers. Não leia se não viu ainda.

Cinema, na mão de alguns filmakers, não passa de vingança. Debra aborda mulheres e seus maridos malvados. Sozinhas, loucas, abandonadas ou em grupos que formam o harém de um traficante, elas buscam/escondem o mal de suas vidas, um pai omisso e drogado e delator desaparecido. A exposição de baixarias não faz de nenhum filme um portento revolucionário. É o caso aqui. A cena da serra elétrica é digna da série do mesmo nome e está no nível dos tomates assassinos. Para vingar-se do mundo masculino, vale qualquer expediente.

Leio as críticas e elas são tão confusas quanto o roteiro. As pessoas não sabem se devem gostar. Mas a charada se resolve facilmente: o plot é interessante, mas a solução da trama não convence, o roteiro se perde. Em O Terceiro Homem, Carol Reed mostra o desaparecido vivo (Orson Welles, inesquecível). Faz sentido.Você não perde tempo vendo um suspense que patina em algo óbvio como a elipse total. Esconder um personagem precisa ser algo passageiro, não definitivo. É o que funciona em cinema. Lembrem de Rastros de Ódio. A garota seqüestrada estava viva? Todas as esperanças se foram. De repente, o olhar de Jeffrey Hunter se incendeia. A índia que mostra os escalpos na tenda do cacique Scar...é ela! São lições básicas de cinema que Debra não assimila. Um mistério não pode aparecer morto. Ele deve pulsar para salvar o filme.Senão o universo perde a graça

Para provar que a adolescente (a bela e excelente Jeeniffer Lawrence, na foto acima) não abandona suas responsabilidades e tem mais tutano do que toda a testosterona reunida no mundo, não precisava exibir uma sequência tão inverossímel de maldade. A cena do barco é de matar o espectador,pela bizarrice e apelação. E aqueles mal encarados não assustam ninguém. São representações do mal masculino, não o mal em si, como Jack Palance em Shane. São extremamente frágeis em suas ameaças e no fim quem dá um pau na vítima não são eles, é o harém – uma forma de mostrar igualdade de gêneros, uma preocupação que ainda vai tomar o imaginário nas próximas décadas, já que estamos ainda começando (coragem!).

Mas a verdade é que as pessoas miseráveis desse filme tem recursos, patrimônio, ganham uma bolada no final, resolvem suas vidas, acham o que procuravam e ainda tocam banjo para alegrar os corações. É um filme bonzinho, mas que se revela vazio apesar de toda a aparência de densidade. Portanto, não há o que confundir. O filme não faz parte das obras cinematográficas que valem a pena. Pode ser visto,mas depois não se queixe.

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