23 de novembro de 2007

ONDE MORA O PERIGO

Os jornais se ocupam dos atores pelados na novela das nove, que está meio por baixo do Ibope; ou do tucanoduto, notícia requentada que volta à tona para nos lembrar para onde vai o dinheiro do país. Mas o que pega é saber o que veio fazer no Brasil o George Soros, o megainvestidor incensado pela mídia como o novo Rockfeller, o cara que quer deixar como legado suas idéias e não a bufunfa que arrecadou em décadas de imperialismo econômico.

A Revista da Indústria, editada pelos jornalistas da Fiesp, entrega: ele veio especular com terra barata, especialmente no Mato Grosso, onde os especuladores internacionais fazem a festa comprando terra a preço um quinto inferior em relação ao meio oeste americano. Será como foi feito no Texas: eles compram, depois anexam como mais um estado americano. Paranóia? Não, fatos. Estamos nos lixando para a Amazônia e o cerrado. O Brasil quer sumir do mapa, tem complexo de culpa atávico.

Na mesma Revista da Indústria, a chamada de capa é: Corrupção – O Brasil tem cura. Deveria ser o contrário: Brasil – Corrupção tem cura. Pois a doença é a corrupção, não o Brasil. Mas fazemos parte de um país que precisa ser “curado” da pior das doenças, a de ter nascido. Curar o Brasil significar varrê-lo do mundo. Culpar o Brasil de nossos deslizes é a forma mais cômoda de se transformar em inocente.

Há grande celebração pelo fato de a Alemanha ter descoberto uma parte da Pan Germânia aqui em Santa Catarina. Acredito que não sejam os alemães os interessados em não enxergar o Brasil, isso eles devem ver com olhos bem abertos, pois só nós para não notar o que está explícito para os estrangeiros.

O perigo mora dentro de nós: tem muito brasileiro que se acha alemão, só pelo fato de os germânicos terem chegado por estas bandas há uns 200 anos. Sabem como era o nome da Natalie Wood? Natalia Nikolaevna Zakharenko. Filha de pais russos, mais americana impossível. Ela não dizia: sou russa pura. Não era cavalo árabe.

Vi dois filmecos recentemente. Um é “O poder secreto das palavras”, com Tim Robbins (ficha ténica via Google, please), produção européia que lambe as feridas da guerra dos Bálcãs, e outro é “Infância roubada”, produção sul-americana que ganhou Oscar de melhor filme estrangeiro e que aborda a grande favela de Johannesburgo. São descrições de horrores para emocionar europeu e americano. Cheios de bons sentimentos e obviedades narrativas, com o agravante da inverossimilhança do roteiro, como acontece com “A vida secreta...”, pois para quê manter o moribundo na plataforma abandonada, no lugar de levá-lo para o hospital? Só para manter relação com a refugiada de guerra?

Bem mais contundente são os nossos “Tropa de Elite” e “Cidade de Deus”. Perto das favelas mostradas por esses dois filmes brasileiros, o lixão sul-americano parece ser de classe média. Pelo menos é mais organizado. O cinema brasileiro atingiu a lucidez necessária para chegar ao nível de arte maior (o argentino, nem se fala), ao contrário de outras obras que ficam rodopiando, enfocando o presente com olhos do passado. Não se trata de chafurdar na crueldade nem de analisar suas origens, mas o de reportar as manifestações do horror em toda a sua complexidade. Há diferença.

RETORNO – Imagem de hoje: Natalie Wood, eterna. Na frente das câmaras, nem precisava tirar a roupa para atrair a multidão.

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