11 de agosto de 2006

HÁ TEMPOS






Nei Duclós

A memória da ponte me alimenta
O horizonte embala o contrabando
O Cruzeiro aponta a lua cheia

Hoje a infância é faca pelo avesso
Correnteza recorda o fio do remo
no recorte do rio, margem de bolo

Na calçada ecoa o esconde-esconde
Não há como enganar o diabo rengo
O revólver descarrega o Ano Velho

Na janela do trem cruza uma estrela
Esporas sapateiam na varanda
Um enrosco de açoite ronda o vento

Habitantes expulsos do poente
O espelho metralhado pelo rosto
O terror sabe a senha do fandango

Era o resto de antigos combatentes
Farelos de luz cobriam ponchos
Mapa embaralhado de rebenques

Comboio cerca o trilho da inocência
A História engatilhada pelo assombro
surra de ancestrais, cabo e sargento

Quando a cidade caiu a seu comando
a paisagem era eterna, havia tempo
O cartucho do passado estava cheio

(Do livro Partimos de Manhã, inédito)

RETORNO - 1. Este poema foi brindado pelo mestre Moacir Japiassu na sua festejada coluna Jornal da ImprenÇa desta semana, no Comunique-se. Os versos iniciais serviram de epígrafe para a coluna e o poema completa foi reproduzido no seu Blogstraquis. 2. Ida Duclós pesquisa a memória familiar e chega até os planos do engenheiro/estadista André Rebouças, no belo blog Nada a ver. Ida é também a autora da matéria de capa da revista Empreendedor deste mês, que está chegando às bancas. 3. Cícero Galeno Lopes, contista e professor doutor em Literatura, faz apurada análise da obra-prima de J.A. Pio de Almeida, As Brasinas, que será publicada em revista acadêmica em breve.4. Imagem de hoje: Sentimento gaúcho, de Felipe Constant.

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