30 de agosto de 2007

BALEIAS E BALÕES



Nei Duclós

Alertado sobre uma família de baleias que fazia evoluções na praia de Ingleses, onde moro, aproveitei a manhã de sol para mais um passeio com minha neta Maria Clara.

Pensei: que bela oportunidade para a criança usufruir da natureza, vendo essas glórias da criação ainda existentes. E elas estão pertinho de nós, praticamente na beira. Puxei a neta num passo apressado e vislumbrei dorsos cinza-esverdeados se sobressaindo no mar azul de inverno. Eram dois adultos e um filhote, pelo menos era o que eu adivinhava na coreografia de esconde-esconde.

No mesmo instante em que nos somávamos a centenas de espectadores do espetáculo, com direito a esguichos e caudas que administravam espumas em gestos graciosos, eis que três grupos de balões multicoloridos amarrados davam sopa bem no limite entre a areia e a água.

Maria Clara ficou encantada com a maravilha da natureza que são os balões pipocando ao sabor do quebra-mar. "Balão, balão", disse, exigente, com passos apressados e dedos decididos. Estava completamente alheia ao centro do picadeiro, uma exibição rara até mesmo em viagem de navio. Fui atrás, avô obediente que sou. Mas não conseguia alcançar nenhum dos tufos de balões, que brincavam de pegar comigo.

Uma senhora, condoída, se atreveu a me ajudar, não sem esforço. Depois de muita luta, ela alcançou um dos ramos de borracha vermelha e amarela, o que deixou Maria Clara pronta para voltar. Pois a idéia era prender os fugitivos num lugar seguro. Para ela, o principal do passeio estava feito: a captura daquela prenda surpreendente, que inventou de rolar bem na nossa frente, fazendo sombra ao que eu achava ser a coisa mais importante da temporada.

Mas não desisti. A toda hora, chamava a atenção da garota, que dava voltas ao redor dos seus balões. Quando ela atendia o meu pedido e se dignava a olhar os gigantes, contra o sol, eles tinham mergulhado por alguns segundos. Ela se virava, mas só via o de sempre: o mar infinito, a ilha lá adiante, navios no horizonte e na ponta direita da praia, a montanha, ou o morro, como queiram. Coisas banais de todo dia. O que é raro é balão pedindo para ser colhido, fazendo concorrência ao foco das atenções.

De mãos dadas com a neta, fiquei bastante tempo admirando a tranqüilidade das criaturas, que devem gostar mesmo é de praia. Sentem talvez uma vontade imensa de viver em terra, e essa, quem sabe, deve ser a explicação de tantas vezes escolherem o encalhe no lugar do alto mar.

Mas aquelas baleias não ameaçavam chegar até nós. Ficavam praticamente no mesmo lugar, gozando as delícias dos remansos da baía. Havia o vento tépido e uma súbita sintonia se estabeleceu entre gente e bicho. De quebra, ainda tínhamos na mão os balões ariscos, soprados num tamanho ideal, para que não estourassem.

Agora eles decoram a cabaninha improvisada no quintal, onde Maria Clara se dedica a alguns afazeres, coisas que não atinamos e que só ela, no seu mundo secreto, sabe do que se trata.

Manhã de baleias e balões: são muitas as atrações desta vida. Depende de cada um perceber onde está o verdadeiro valor de uma miragem, uma surpresa, um presente, prendas de um dia inigualável deste lugar ainda habitável, tanto para gente, quanto para outras manifestações da natureza.


RETORNO - 1. Imagem de hoje: ilustração de Juliana Duclós. 2. Esta crônica foi publicada no dia 28 de agosto de 2007 no caderno Variedades do Diário Catarinense.

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