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31 de março de 2005
31 DE MARÇO DE 1964, CRIME HEDIONDO
Está no site oficial do Exército brasileiro um texto que dá o alarma sobre a verdadeira natureza da falsa democracia de hoje: a de que continuamos no regime de 1964, consolidado em 1985 com a posse do ex-presidente da Arena (o partido da ditadura), José Sarney. Pois o presidente Lula, sendo o comandante em chefe das Forças Armadas Brasileiras, como reza a Constituição, torna-se conivente com as seguintes posições, que constam nesse site: "No início de 1964 vivíamos um ambiente que refletia as inquietações de um mundo ideologicamente bipartido. Receios, incertezas, conflitos e perplexidade por toda parte. Agitadores infiltrados nas instituições legais realizavam um trabalho destrutivo das estruturas. Buscavam substituir as Forças Armadas por milícias. Disseminavam a anarquia. Virtudes, autoridade legal e consciência nacional claudicantes. Foi preciso coragem para defendê-las e preservá-las. O povo brasileiro precisou de alta dose de disciplina para manter-se fiel discípulo de sua própria vontade. (...) Vitoriosa, a Revolução de 1964 nos assegurou perspectivas mais nítidas de convivência e a tolerância com limites. Ela nos passa a silente mensagem de que, a qualquer tempo, atentos e preparados, estaremos prontos para a defesa da democracia".
POPULISMO - Pessoas podem defender esses argumentos toscos, mas não um texto abrigado numa instituição do governo da República. Não se pode justificar assim a derrubada de João Goulart, que foi eleito vice-presidente pelo voto direto, e ungido presidente por um plebiscito popular (onde obteve grande maioria dos votos) depois da renúncia do populista Jânio Quadros (a direita inventou o populismo para tentar vencer o trabalhismo nas urnas; foi desmascarada por Jânio, que não agüentou o repuxo; por isso partiu para a ignorância em 1964, sendo que já tinha tentado em 1955, quando foi derrotada pelo contra-golpe do marechal Henrique Teixeira Lott). No texto há também a ameaça velada de que esse tipo de intervenção poderá se repetir. Passaram décadas exercendo a ditadura dizendo que defendiam a democracia. O que houve não foi a infiltração, nem a ameaça das milícias, nem destruição das estruturas, mas sim o fracasso de um projeto da direita. É fácil de entender. O golpe de 29 de outubro de 1945 derrubou Getúlio Vargas, o presidente que enviou tropas brasileiras para lutar contra o nazismo e o fascismo (ao contrário da Argentina, que apoiou a Alemanha e abrigou os carrascos). Os regimes autoritários foram derrotados na Europa, mas inspiraram o poder nos Estados Unidos, onde existem até hoje sob a forma da mais horrenda ditadura imperial planetária (são racistas, se acham o povo escolhido e querem o mundo todo para eles).
DIREITA - Aqui no Brasil, a direita quis fazer o que faz hoje, ludibriar o povo por meio das campanhas políticas de cartas marcadas. Mas o trabalhismo não deixou e foi crescendo na base do voto popular (para isso foi consagradora a vitória de Getulio em 1950, contra todo o marketing da época). Com o desgaste do regime ditatorial de 64, instaurado para impedir a ascensão do trabalhismo, era essencial a neutralização dessa força eleitoral no projeto da chamada distensão política, obra da direita para perpetuar-se no poder (de autoria de dois ditadores, Geisel e Golbery, que tem como historiador oficial Elio Gaspari). Inflaram Lula (sabiam em quem confiar) e desmoralizaram a sigla histórica, o PTB. Empurraram Brizola para o fundo do poço, com a ajuda da distorção do voto trabalhista, a ilusão petista, escada para a ascensão social do lumpen proletariado e da classe média escolarizada que subiu na vida graças à cultura (como já notava Plinio Marcos em suas crônicas na Folha no final dos anos 70) e à política. Foi assim que o golpe triunfante de 1964 (a chamada Revolução vitoriosa, como diz o site do Exército) estabeleceu-se para sempre. Hoje esse regime completa 41 anos de poder.
AO VIVO - Tive o privilégio de viver sob um governo municipal trabalhista enriquecido pelo socialismo. O prefeito Antonio Chiarello, líder dos bancários, fazia parte de um grupo de socialistas que uniram-se aos trabalhistas nos anos 40. Nos anos 50, sua gestão em Uruguaiana foi um primor. A cidade era resplandescente. Como lá existe o clima do deserto (la pampa, como dizem os argentinos), muito calor e muito frio, árvores foram plantadas por todas as calçadas, fruto da noção do equilíbrio ambiental, coisa que hoje é só discurso. A cidade era varrida regularmente todos os dias. Havia paz, riqueza e concórdia. Havia autoridade, saneamento, educação e saúde. Chiarello é pai de Nidia e Nicia, colegas de minhas irmãs. Nidia (Didi) casou-se com Agildo Ribeiro, que vem a ser filho do revolucionário Agildo Barata, que participou de 1930 (ocupou o lugar do arquivo do Juarez Távora num pequeno avião quando foram comemorar a vitória da revolução no Rio; o arquivo perdeu-se para sempre); de 1932, quando foi preso de pijama antes do movimento estourar, graças à irresponsabilidade de Julio de Mesquita (sempre tão incensado no Estadão; enfim, o ser humano perfeito); e em 1935, na chamada Intentona Comunista. É história demais? É como dizia para mim Samuel Wainer, quando eu me retirava no meio das histórias que me contava: o que é isso, menino, não queres ouvir História do Brasil ao vivo?
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