4 de junho de 2017

O REPÓRTER QUE DESCOBRIU O INCÊNDIO



Nei Duclós

Wagner Carelli me contou esta história numa das muitas noites no Bar Redondo. Ele era novo no jornal e foi cumprir uma pauta num lugar perto da sede do Estadão, em São Paulo, naquela época situada no centro da cidade. Mas mudou de assunto, pois viu que o edifício Andraus, na esquina da São João com a praça da República, estava pegando fogo.

Ligou para a redação informando sobre a tragédia e que estava a postos para fazer a reportagem. Ficou no prédio em frente acompanhando o trabalho dos bombeiros e o desespero de quem se aglomerava na cobertura do Andraus tentando escapar da morte certa. Viu quando o governador chegou de helicóptero para falar com as vitimas.

Voltou para a redação e começou a narrar os fatos. Uma colega veterana veio ler por cima do seu ombro e falou. Ei, por que a cena do governador está no pé do teu texto? Você deve abrir com isso. Carelli, obedeceu. Abriu com o pé do governador pisando na cobertura.

Assim começou a carreira brilhante deste jornalista em início de carreira em 1972, gênio confirmado depois ao inventar a revista Bravo! (comprada e destruída mais tarde pela Abril, que tinha medo da concorrência), e escrever textos antológicos como o Precoce Verão dos 80 na IstoÉ, que causou um terremoto no jornalismo dominado pelo deslumbre aos anistiados, e hoje entrevistador no filme bomba O Jardim das Aflições,

Wagner iria escrever um texto tradicional mas foi alertado para a possibilidade de fazer melhor e diferente. Isso num grande jornal, sinal de que havia espaço para a criatividade inclusive nos fatos mais urgentes. Só porque é notícia de última hora não precisa ser escrita de maneira tosca.

Dizem que as antigas redações eram românticas, mas ninguém cometia obviedades e burrices como acontece hoje a três por quadro, pois havia um corredor polonês de cascudos e orientações dos escribas veteranos. Ao chegar num jornal, você era adotado pelos mestres e se encaminhava para a vida.

No caso do grande incêndio, não tiraram o crédito do estreante, antes o incentivaram a fazer o melhor e mais importante texto de sua vida. Assim se comportavam as pessoas com coragem e talento daqueles tempos.


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