2 de janeiro de 2012

MISSÃO IMPOSSÍVEL - PROTOCOLO FANTASMA: SOMA DE CINEMA


Nei Duclós

Ethan Hunt (Tom Cruise) está ferido num hospital e lê os lábios de dois agentes russos numa conversa a distância. A referência é conhecida, a leitura labial feita pelo supercomputador Hal em 2001, de Kubrick. A agente interpretada por Paula Patton segue a câmara instalada num balão vermelho que sobrevoa Moscou. Também uma referência clara ao Balon Rouge, de Albert Lamorisse, sem naturalmente a natureza inocente do clássico filme francês. O atentado ao Kremlim é uma referência à destruição das Torres Gêmeas de Nova York em 2001, ou seja, a eliminação de símbolos imperiais. Além de lutas inspiradas nos filmes do gênero, chineses, cenas de suspense tradicionais, tralha tecnológica ao estilo 007 etc.

Seriam apenas citações, ou um filme de ação é soma de cinema, em que o conteúdo se reporta sempre ao cânone das soluções cinematográficas e forma uma superfície em movimento que encerra a história em si?

Não obrigatoriamente, pois o que pega nesta Missão Impossível - Protocolo Fantasma, o quarto filme produzido por Tom Cruise e agora a cargo do diretor Brad Bird, é oposição permanente entre as maravilhas da tecnologia digital e o esforço físico puro e simples, a briga entre a missão e a emoção, entre a ordem e a vingança, entre a competência profissional e o fracasso pessoal. Há uma encarnação humana no escopo artificial das situações forjadas, da bizarrice dos fatos e falta de verossimilhança geral. O exagero absoluto das técnicas se batem contra as limitações do coração ou dos princípios. Isso gera contrapontos importantes num filme que tem tudo para ser apenas uma grande bobagem e não é.

Sabemos que não. Um produtor independente que escolhe seus cineastas e desenvolve filmes a partir de uma bem sucedida série de televisão no passado bate recordes exatamente por acumular em seu design e narrativas várias conquistas da Sétima Arte voltada para a ação e a aventura. Ethan e sua equipe (interpretada por Jeremy Renner, Simon Pegg e Paula Patton) precisa trabalhar depois que sua agencia IMF, sem apoio do governo, que a torna fantasma devido ao atentado ao Kremlim, tem de provar que não é culpado, fugir da polícia russa que o acusa de terrorismo e perseguir o bandido (interpretado por Miachael Nyqvist) para evitar uma guerra nuclear. É soma de cinema em camadas, criando uma superposição de linguagens reconhecidas mas colocadas num carrossel alucinado.

A história está adaptada aos novos tempos, mas não dispensa velhos fantasmas. Há uma ameaça da volta da guerra fria, já que o jogo das potências vive por um fio. Mas fica consolidada a idéia de que Russia e EUA não são inimigos e que o verdadeiro adversário é o terrorismo. Brad Bird e o roteirista André Nemec exageram nas situações limite, que Tom Cruise jura ter feito sem doublé, como na famosa sequência no mais alto edifício do mundo. Para mim é truque, mas todos juram que ele fez tudo aquilo mesmo. Na fronteira dizíamos “é fria” toda vez que aparecia algo parecido. Mantenho a dúvida.

O filme bate recordes assombrosos de bilheteria, principalmente no Brasil, terra da imobilidade. A ação nos fascina, é tudo o que queríamos, ter a capacidade de agir. Pena que o modelo seja importado e fique a cargo de mega-comerciantes da indústria do espetáculo. As emoções e princípios aos quais me referi logo acima são rasas, previsíveis. Funcionam para o filme. Mas não tem uma dimensão artística importante. Assim mesmo, Protocolo Fantasma vale a pena. Eu me diverti, principalmente quando Tom Cruise consegue escapar do hospital pelo alto, deslizando num fio. Bárbaro. É quase um filme de Tarzan.

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