Nei Duclós
Fim dos cadernos de cultura na imprensa. Sempre fora
considerados um desperdício de espaço não só pelo departamento comercial como
pelos seus concorrentes, os jornalistas de outras seções, que costumavam lutar
por alguns centímetros a mais no noticiário, enquanto o pessoal da cultura
esbanjava, se estendia sem limites. De venda difícil, a não ser pelo patrocínio
oficial ou sob o guarda chuva de megaempresas ou bancos, o que reduz bastante o
espectro, pois como patrocinar um caderno de cultura em cada veículo? Visto por
cima o caderno cultural era uma espécie de aristocracia da midia, onde os
textos podiam fazer o que era proibido ao resto do jornal: viajar na maionese,
garantindo o crédito do autor da resenha, artigo, coluna ou reportagem. Ser
paparicado pelas assessorias de imprensa da indústria cultural era um
privilégio não extensivo aos colegas de assuntos considerados mais árduos.
Antes que o entretenimento substituísse a cultura, era
possível cobrir a multiplicidade de acontecimentos do mundo dos livros e da
música e das artes, cobrindo cada lançamento, comparecendo a cada show cult
fora dos circuitos oficiais, resenhando o lançamento do autor maldito,
incluindo a banda que amargava a lista negra de alguma autoridade midiática.
Mordomias costumavam chover na área cultural da imprensa, como livros (milhares
de deles), cds, LPs,, revistas especializadas, ingressos para shows, convites
para viagens etc
Na Ilustrada, da Folha, além de copy passei um tempo
cobrindo música brasileira fora do samba, ou seja, o jornalista Dirceu Soares
não suportava música pop ou rock. Assumi o encargo alegremente. Na revista
Senhor, editei uma seção de livros por cinco anos e fiz minha biblioteca - isso
que eu entregava o livro para cada resenhista levar para sempre, além de a
direção remunerar o artigo como se fosse reportagem.
Ali exerci algo que considero o caminho para o noticiário
cultural: os assuntos serem tratados como matérias normais do noticiário e não
algo bizarro ou especial. Livros e comércio, shows e política, tudo se mistura.
Vejo El Pais e The Guardian com poderosos noticiários culturais tratados como
devem, ou seja, como assunto hard de jornal e não como amenidades e
frescuras;.Essa é a saída. Lamentamos o fim dos cadernos culturais como foram
concebidos, mas a fila anda. E não é o fim do mundo. É apenas a vida e seus
desdobramentos. O que atrapalha é o virus das celebridades, em que cada ida ao
banheiro de alguém muito conhecido vira chamada de capa.
RETORNO - Imagem desta edição: foto minha feita na Bienal do Livro do Rio.
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