26 de dezembro de 2007

FERIADAÇO: A MERCADORIA ÀS MOSCAS


Estive no shopping vazio em pleno 25 de dezembro. Tudo fechado. Uma sociedade focada no consumo perde o sentido quando chega o feriado definitivo, como Natal, Ano Novo, Sexta-feira Santa ou Finados. O mundo como mercadoria não está voltado para o humano, que fica enterrado sob toneladas de quinquilharias supérfluas. Não dava para sentar no shopping às moscas. As cadeiras das lanchonetes estavam amarradas, para impedir que transeuntes ocasionais, como eu, as usassem.

Os instrumentos urbanos estão sob estrita vigilância privada. Foi-se o espaço público, em que a população compartilhava atos corriqueiros como sentar, passear, conversar, em função de algo que não estava à venda. Isso ainda existe em outros países, que preservaram coisas simples como lago com marrecos, chafarizes e pontezinhas. Aqui, o que restou do espaço público está sob a guarda de alguma empresa instalada ao redor (as tais ambientalmente sustentáveis, ou seja, pagam um jardineiro em troca de usar a rua como estacionamento privado, ou instalam um canteiro cercado de arame farpado). Ou então está tomado de excluídos sociais, pois o sistema empurra as pessoas até a insânia da mendicância.

Os lugares que atraem muita gente, como as ruas comerciais e os shoppings, e que ficam absolutamente vazios quando chega o feriadaço, expõem o erro da nossa opção em apostar tudo nessa espécie de pré-capitalismo predatório, onde a concentração de renda, o fluxo de capital e produtos, o endividamento coletivo, a aceitação de porcarias importadas de todos os tipos, definem o perfil do país em ruínas. Governo e mídia celebram o fato do pobrerio está chegando nos shoppings. A tragédia é profunda.

No lugar de gerar um sistema de distribuição justa de renda, conseguem achatar as classes sociais, irmaná-las no mesmo tipo de hábito atraindo novos contingentes de consumidores. Não há mistério nessa tendência que dizem ser de inclusão social: como a indústria fajuta aumentou seu potencial de produção, é preciso que mais trouxas se acerquem do horror para a coisa funcionar.

O que me espanta é que as pessoas reproduzem, no visual e nos hábitos, essa produção em massa exposta em milhões de lojas de horrores. Pois ninguém me convencerá ao contrário de que existem fábricas de garotões sarados com braços possantes tatuados, todos com uma latinha de cerveja na mão. Só pode ser isso, senão como conseguiríamos ver em cada metro quadrado um desses exemplares? O pior é o avanço de maus hábitos como deixar a bermuda cair até aparecer os pentelhos e um pedaço do rego, tudo pontuado pela velha coçada no saco. É assim que se comportam, deve ser assim que são treinados.

Antes dos anos 60, estávamos convencidos (ihhhh) que bastava tirar o treinamento coletivo de almas dóceis ao capitalismo para que a humanidade mostrasse então sua verdadeira natureza de bondade . Então a educação e a família foram praticamente destruídas e no seu lugar colocaram a mídia que, por sua vez, treina os novos retardados. Substituíram o treinamento reacionário pelo caótico. Não há como escapar da formação de fora para dentro. É preciso reinstaurar a educação, senão o sujeito do banco ao lado vai se esparramar até o osso, pois assim é que ele desaprende na escola e na própria casa.

Retirar a natureza comercial do mundo como mercadoria é tarefa para mais de uma geração. Não se trata de implantar ilusões espelhadas na acomodação feita a ferro e fogo pelo capital, inclusive seu falso antídoto, a utopia comunista. O que precisa ser feito é voltar o foco para o humano e isso se faz com políticas públicas, com governo fora do circuito comercial-industrial. Não é simples, mas não é impossível.

RETORNO - Imagem de hoje: Bairro da Liberdade, foto de Regina Agrella.

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