22 de janeiro de 2004

NA PEDROSO, COM GIM TONES



O inenarrável repórter policial me aparece na nova redação vestido de motoqueiro sem moto, todo coberto de plástico para enfrentar a famosa chuvinha fodegosa que caiu hoje no Brasil de Sampa a Floripa (conheço o clima numa distância de 700 quilômetros), animado com o Ano do Livro e me convence a misturar chope gelado com caldo quente de feijão regado a cachaça Boazinha. Nesse ínterim, alguém ficou presa na casa em frente e, como só acontece em grandes reportagens, o sonso jornalista atravessa a rua convocado pela aventura . Não perca as próximas linhas.

DESTINO - É uma questão de linhas escritas na palma da mão. Lembro que na minha visita a Uruguaiana, quando fiz o périplo resgatante no carro regado a chimarrão do Anfitrião da Tríplice Fronteira Anderson Petroceli, passei algumas horas na mais completa tranqüilidade. Pois foi voltar para a praça e escutar de Tabajara Ruas, autor da obra-prima “Perseguição e Cerco a Juvêncio Gutierrez”, que também tinha saído a visitar a cidade, mas por sua vez no famoso “diapé”, a história assombrosa de que foi testemunha de um tiroteio, tendo adentrado no recinto dos balaços (logo depois do evento, claro), para verificar o estrago em algum conterrâneo que exibia o sangue dos inocentes. É como eu digo: tem gente que nasce para a aventura. Com Gim Tones dá-se o mesmo. Enquanto nos ocupávamos com mil lides editoriais, o solerte jornalista exibia seu olhar pela janela quando gritos da frente o convocaram para um resgate. Parece que a vizinha, tradicionalmente nervosa com o rompimento do seu matrimônio, tinha se encerrado sem querer atrás do grande portão (é uma região de grandes mansões e portões) e gritava por socorro. Pois não é que Gim prontificou-se a atravessar a rua e salvar a ilustre vizinha, notória por sua capacidade de gritar sempre que o ex-marido lhe aparece nas fuças, quando é alvo de ameaças como “essa conta vou mandar para o teu apartamento”. Depois do resgate, a vizinha aos brados contou o infortúnio para nosso repórter, que assim cumpriu o destino aventureiro da sua estirpe, deixando-nos boquiabertos com a oportunidade única que se lhe apareceu, ele que nunca visita a redação, redação que nunca é dada a esse tipo de ruído, já que se dedica as altas esferas da melhor literatura brasileira e mundial. Pois é assim, meus amigos e amigas, é assim que se manifesta a vida e suas escolhas. Não tive outra alternativa do que levar meu amigo para o Pirajá, prainha da Pedroso de Moraes, onde desfrutamos de uma conversa interminável sobre a linhagem da reportagem policial no jornalismo brasileiro.

DESPISTE – Para impressionar o solerte pesquisador de histórias desumanas da periferia e texto maior da nova safra de escritores brasileiros, tentei vestir de carisma minha trajetória de vida colocando o talento como coisa comum entre edição e reportagem. Nesta, destaco como diferencial básico a coragem. O repórter que se aventura na favela para trazer a história que ninguém conta tem em mim o admirador número um. Contei ao garoto quase trintão a importância de pessoas como Pena Branca e Hamilton Almeida Filho, já que de Caco Barcelos não preciso nem traçar mínima biografia, pois é público e notório que Caco é o verdadeiro nome da coragem. Gostei de ver Gim Tones animado com as perspectivas que se abrem no Ano do Livro, pois já estava preocupado com sua longa descida aos infernos da lassidão desempregatícia, já que o Império da Idiotia erradicou o talento das redações como se tirasse fora ervas daninhas. Mas o talento soa como uma rebelião, como falei recentemente para meu consideradíssimo amigo e escritor maior Moacir Japiassu, que aos poucos planta os pés para fora do Brasil com sua grande literatura e nos prepara uma surpresa de arrepiar para os próximos meses.

AUTORES - É desse jeito que vivo atualmente, entre meus queridos escritores, que palmilham o território da criação na maior das dificuldades, sem querer saber do dia de amanhã, pois o futuro nos pertence, assim como o presente é uma presa fácil em nossas mãos cheias de vontade de acertar o passo. Espero que estas linhas agradem os leitores deste espaço, que está meio atirado por absoluta falta de tempo, mas não por falta de vontade. Pois vontade sobra e estamos prontos para atravessar o rubicão com as palavras que preparamos para cumprir nosso destino. Nós, brasileiros, somos assim, por isso somos os melhores.

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