29 de novembro de 2021

PLUMAS

 Nei Duclós 

Sou o pássaro que escuta Ouvido PLUMAS Sou o pássaro que escuta Ouvido canoro de uma festa: Tua voz, trinado de canções ocultas Vivo de ouvido, cantora de violão em punho Pinho de plumas: notas aladas de um convite Sou o pássaro que escuta Teu coração é o pulso Da minha arte, a poesia Nei Duclós de uma festa: Tua voz, trinado de canções ocultas Vivo de ouvido, cantora de violão em punho Pinho de plumas: notas aladas de um convite Sou o pássaro que escuta Teu coração é o pulso Da minha arte, a poesia 

21 de novembro de 2021

BRIGA

 BRIGA Todos conhecem flores Sabem os nomes Batizam espécies Detectam nuances de perfume e néctar Cortam, colhem fazem arranjos Cobertos de papel celofane Exibem as pétalas de colarinhos brancos Mas só tu, fogo, pólen É flor de verdade, cada vez mais bela De olhar mais doce Pele de fada E não pode dizer que me ama Porque tem compromisso E desmaia Toda vez que se declara Aberta como um talho de adaga Depois de uma briga de foice Pelo amor que nega Nei Duclós

0 ADEUS

 O ADEUS O adeus tirou o que tinhas me dado O amor sem limite O sonhar acordado O adeus me levou a viver no passado O perfume da noite O corpo grudado O adeus inventou este rosto riscado O andar de mendigo O olhar sem um norte O adeus não costuma escrever uma carta O correio fantasma Envelope sem data O adeus não permite o muito obrigado Não há mais surpresa Para alguém solitário O adeus não passeia nos cantos da praça O inverno perene A mudez dos pássaros O adeus é o que resta Do teu beijo molhado O ar que me falta O calor da tua graça Nei Duclós

DESTINO

 Nei Duclós 


Morei no paraíso Gênesis da infância Quando o tempo não desanda Acolhido pela memória Tudo o que foi dito é repetido Nos cadernos de aforismos dos antigos Nascemos depois, sob artifícios De palavras escritas por reis líricos Não penso mais, perdi o brilho Quero apenas que voltes, amor perdido Só tu presta atenção ao meu comício E encara minha sorte por princípio Contigo fundo a filosofia Para discípulos do sentimento É o único jeito de ser feliz Entregar o destino à poesia Nei Duclós.

20 de novembro de 2021

LENÇO

 Nei Duclós 


LENÇO Cortejar não é assédio Mas aproximação de comum acordo A diferença está na intenção A corte civilizada não é invasiva nem violenta É amostra do futuro amor E um pedido de clemência Do desejo preso pela distância Atenda meu gesto, bela criatura Sou feixe de nervos, barco sob o sol Alcanço-te um lenço que cedeste distraida Que eu te devolvo em beijos Na tua mão E o sonho de lençóis em nossa vida 

GOTAS

 Nei Duclós 

GOTAS Escapas das mãos como gotas amparadas por um amor sem reservas Que assim te perde Achei que por ter sido nuvem manterias a forma flutuando intacta no crepúsculo Mas veio a noite E veio a chuva Meus pés perdidos estão encharcados De estrelas cadentes E úmidas 

14 de novembro de 2021

TODA ARTE

 Nei Duclós 


Ninguém vive sem a arte A própria ou a feita de outras mãos Momento sonoro no chuveiro Qualquer borrão de lapiseira Brinquedo de vidro, pintura A madeira encaixada na moldura Os garranchos de amor no caderno da colega A fantasia, a bolsa de palha Toda arte é humana corrente De um rio sobrevivente Nei Duclós

SUSTO

Nei Duclós 


O orgasmo como autópsia em corpo vivo Cada órgão vibra em tuas mãos dilaceradas E os olhos roçam o teto Como Tupã troveja na tempestade Na aparência estás muda Sentas na mesa como a deidade desce à terra Depois de colocar a corte de Zeus De pernas para o ar Ninguém ousa perguntar o motivo do transtorno Nem mesmo eu, soldado que ficou de guarda E te viu através de mil cortinas Eras a bailarina na noite em que todos foram à guerra Impossível recusar teu convite Juno, Medusa, Afrodite Levei um susto que rasgou o céu E verteu a teia múltipla de estrelas Nei Duclós

13 de novembro de 2021

CAÇA

 Nei Duclós 

Visitar as palavras na prisão não gera um poema Soltá-las é uma ilusão Pois carregam a punição lá fora A solução é penetrar no mato Atrás do verbo selvagem Fique longe do noticiário Não engrosse a corrente de pensatas Nem faça laboratório atrás da panaceia Não debata, não desconverse Não advogue em porta de cadeia Vá à caça Busque a fera Encontre o canto solto e suas garras 

11 de novembro de 2021

NEVOEIRO

 Nei Duclós 


 O amor desce como nevoeiro depois do entardecer Nao chega a ser neblina, fog, fogo fátuo ou sei lá o que É mais uma chuva, uma paisagem de Monet Que cai em meu sobretudo sem se ver De repente estamos impregnados do bouquet Que teus lábios marcam antes de partir A lua sente pena desse amor que não tem vez E vinga-se soltando plumas, o amanhecer l

10 de novembro de 2021

PERFIL

 Nei Duclós 


PERFIL Todos sabem como eu sou Um rosto para cada verso de amor Todos sabem como és Mulher que nenhuma chega aos pés Não acreditas porque é verdade Arte de Inverossímel beldade 

9 de novembro de 2021

SÓTÃO

 Nei Duclós 

SÓTÃO Visitei o sótão de poemas Guardados numa vida em pensamento Estava vazio, sem serventia Dispersei como areia ao vento Teriam valor? Cedo me convenço Mas fingia a dúvida que já existia Desde o princípio O resto, perdi tempo Talvez fossem fortes num primeiro instante E ocupassem espaço, os tratantes No fundo eram apenas companhia Para a solidão do espírito sem habite-se Chega o momento em que não mais funciona O charme e a autocrítica infame A obra é um sonho no derrame Ficamos paralisados pelo medo O segredo é saber onde se situa A palavra afiada em terra bruta És pedra, me disse um anjo Voas no alto da montanha Toda vez que a águia soberana, os sobreviventes Pousam os olhos em teu encanto São as vitórias numa guerra perdida, a de ser humano Nei Duclós

1 de novembro de 2021

LUZ QUE TE DESENHA

 Nei Duclós 


LUZ QUE TE DESENHA Venha dizer, maçã e gerânio. Sopro macio, que cruza o oceano. Domar a vontade de perder-me. Mergulhar na luz que te desenha Dormimos ao relento de um amor no começo. Complicado jogo de cobertas. Acordamos em alto mar, mortos de espanto. Não há segredo. E quando houver, deixe. Fora do molde, longe do modelo. Apenas nós, criaturas precárias. A única força é esse sentimento. E, claro, o extremo cuidado com algum detalhe, para fisgar o beijo. Te escondes, tentação de fogo. Me queimo, diante do teu corpo. Falo cifrado para que não atentem, pitonisa de sonhos. Estavas quieta, contente. Fui mexer contigo, travesso. Lançaste uma flecha, veneno. Depois me queixo, em teu banho. Lanças uma ponte, o namoro. Difícil, com minha vocação de abismo. Te inventei, porque te foste. Depois que me desconstruíste. Arquiteta pelo avesso. Floriste, por hábito. Oculto riso sob o rosto imóvel. Ninguém viu a correnteza interna. Só eu, demiurgo do verbo. Não sei mais o que dizer, disse ele. Permaneça no beijo, disse ela. AGRADECIMENTO Tanto amor que nem mais cabe nos limites do dia. Extrapola, como estrela cadente ao contrário. Sai do fundo da terra para o espaço Incendeia-se em permanente viagem Tanto amor que vira ciranda na mecânica dos astros música das esferas constelação de abraços Nei Duclós Para todos que me felicitam neste 29 de outubro