8 de março de 2012

PORTA


Nei Duclós

Está ficando tarde. Passou da hora de pedir que voltes.

Não feche a porta a chave. Você pode precisar, sei lá, de uma toalha. De um beijo encardido de quem te ama?

Mandei o serralheiro embora. Tirei a porta.

Vem comigo, dorme. Ainda é cedo? Chora.

Talvez a lágrima seja a única água que não tenha medo de se jogar no abismo do teu lago.

Vou confessar, não sei mais o que fazer com essa demora. Vou começar a chutar as paredes que cercam teu cais.

Só você não escuta o bater do sino da minha palavra. Talvez por estar acostumada. Ou então por impedir que o som da minha voz, pomba, pousasse no teu ombro.

Vê se não me apronta. Não use o amor como revanche. Mantenha o prumo. Lembre que és rainha, mesmo presa na masmorra do sonho.

Não podes brigar comigo, está proibida. Tenho sintonia com o que mexe contigo, mesmo à tua revelia. Te vingas sendo tão linda.

É covardia te amar tanto. Não minha, tua.

O que vale é a companhia nesta viagem onde a leitura é a criatura mais bonita.

Voce é over. Tenha noção da sua impostura e pouse com cuidado. Só machuque em comum acordo.

Remorso não cura. Intensifique o quadro clínico da tua curva

Melhor escapar dos teus encantos. A não ser que repitas a dose.

Semana bem no meio, trânsito. Dinheiro que vem e já foi embora. Uma vida sem sossego. Pousa em mim, borboleta.

Nem deixei você sentir saudade. Não aprendo mesmo

Onde estás? A manhã está sendo sequestrada pelo tempo e nem sequer pediste resgate.

Violenta violeta vibra a viola, a corda que sobra não se consola, devolve a nota suspensa da flor densa de sangue da virtuose.


LUA, PUMA


Amanheceu perto da meia noite. Quem precisa de sol? A noite pega um bronze na Crescente.

Boiam estrelas de metal. Batem na Lua assustando os bichos. Menos tu, fêmea, domínio sobre o puma.

Moro perto da rainha. Corre pelo trilho do céu, logo aqui em cima.

Noite alta, alto mar. Uma dança sobre as águas. O sal do sabor, o mel do sopro. Pomos a culpa na Lua, mas somos nós, doçura.

Dança comigo? Debaixo da Lua. Cuidado para não desmanchar comigo numa volta desse grude.

A Lua trouxe um presente. Lívida,lisa, ela representa a suprema contingência de estarmos juntos. Sussurros.

Não tente impedir a Lua. Ela tem a força das marés. Submeta-se à sua doçura.

O dia cobre a Lua por um tempo para que não haja excessos. Mas ela fura o bloqueio e surge, espantosa, transparente na tarde.

Ok, não houve nada. Sou um objeto estranho na calçada por onde passas.

Ah, tá, foi a Lua. Só que bateu no meu continente, selenita.

Entendi, foi só teatro. Então ocupa o palco de novo que eu aplaudo.

O que faço com a sobrevivência daquele agarro? Bato na tua janela. Conto tudo para a Lua.

Não acredito em tão próximas cinturas. Foi mesmo um sonho, lisa como o brilho do mármore.

Agora é aguentar o tranco até que o sol se manque e caia de banda dando vez ao coroamento da Lua Cheia.

Há claridade demais no dia, fico transparente. Prefiro ser fosco no ambiente noturno, quando pisca tua gana de caçadora.

Vou tirar a sorte no realejo. Daqui a quantas horas ganharei teu beijo?

Olhei pensando que era ainda Crescente, mas disse: É Cheia! Ex-adolescente, ficou toda orgulhosa.

A Lua cheia sempre riu da pergunta sobre quem inventou a roda.

O sol que fez à tarde inflou a Lua cheia

Ela mantém o lance em suspenso. Fica no miolo do céu, serena, jogando pesado sua luz extrema. Cairá no campo adversário? Do nosso lado? Com qualquer decisão, ganharemos, tontos com sua beleza.


RETORNO – Imagem desta edição: Lauren Bacall.

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