4 de outubro de 2009

GRACIAS A MERCEDES, QUE NOS HA DADO TANTO



Mercedes Sosa é o melhor da Argentina, essa porção do país vizinho que nos deslumbra, da música ao cinema, da luta democrática à capacidade de auto-superação. Nascida e criada na Argentina profunda, em Tucuman, atraiu grandes artistas e intelectuais e interpretou o fino das canções do continente, de Violeta Parra a Chico Buarque. Como todo artista, engajou-se na política, transformando-se num símbolo de resistência contra a invasão americana e a busca de uma identidade comum na América latina.

Seu grande sucesso, de autoria da chilena Violeta Parra, é uma canção de amor, que fala “no homem que eu amo, na voz tão terna do meu bem amado, na rota da alma do que estou amando, o fundo dos teus olhos claros”. O amor como representação do canto comum, coletivo: “O canto de vocês é o mesmo canto/ e o canto de todos que é o meu próprio canto”. È o talento, o amor (trágico em Violeta Parra, que acabou se suicidando depois de uma desilusão amorosa) unidos na sua voz magnífica, capaz de fazer chorar as pedras, que une Mercedes à eternidade. Não é a política, por mais que a usem como símbolo, por mais que ela mesma tenha se instaurado como porta-voz da insubmissão.

Sabemos no que resultou o movimento cultural e político da Nuestra América: meia dúzia de estadistas toscos invadindo embaixadas, comprando mísseis, governando para os banqueiros, vingando passados longínquos, atraindo ditadores de outros continentes. Esse acervo não faz parte da grande Mercedes, que nos deixa aos 74 anos depois de longa vida dedicada à arte. Voz de contralto, diziam. Voz vinda do talento, esse mistério da sabedoria.

Em Uruguaiana, fui criado, entre outros gêneros, pela música folclórica argentina, especialmente o chamame. Faz parte da nossa formação ouvir os argentinos, que em algumas coisas fazem jus à sua auto-estima excessiva. Mercedes transcendeu, superou-se e nos legou uma herança maravilhosa, que nos acompanhará sempre.

GRACIAS A LA VIDA

Violeta Parra

“Gracias a la Vida que me ha dado tanto
me dio dos luceros que cuando los abro
perfecto distingo lo negro del blanco
y en el alto cielo su fondo estrellado
y en las multitudes el hombre que yo amo.

Gracias a la vida, que me ha dado tanto
me ha dado el oido que en todo su ancho
graba noche y dia grillos y canarios
martillos, turbinas, ladridos, chubascos
y la voz tan tierna de mi bien amado.

Gracias a la Vida que me ha dado tanto
me ha dado el sonido y el abedecedario
con él las palabras que pienso y declaro
madre amigo hermano y luz alumbrando,
la ruta del alma del que estoy amando.

Gracias a la Vida que me ha dado tanto
me ha dado la marcha de mis pies cansados
con ellos anduve ciudades y charcos,
playas y desiertos montañas y llanos
y la casa tuya, tu calle y tu patio.

Gracias a la Vida que me ha dado tanto
me dio el corazón que agita su marco
cuando miro el fruto del cerebro humano,
cuando miro el bueno tan lejos del malo,
cuando miro el fondo de tus ojos claros.

Gracias a la Vida que me ha dado tanto
me ha dado la risa y me ha dado el llanto,
asi yo distingo dicha de quebranto
los dos materiales que forman mi canto
y el canto de ustedes que es el mismo canto
y el canto de todos que es mi propio canto.

Gracias a la Vida
Gracias a la Vida
Gracias a la Vida
Gracias a la Vida"

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