7 de setembro de 2009

COMO UM CACHORRO MORTO


Já ouvi mais de uma vez essa expressão no noticiário: jogaram a pessoa agonizando dentro da viatura, do carrinho de supermercado, do saco plástico, "como um cachorro morto". A testemunha que viu a garota de 16 anos ser baleada na favela de Heliópolis, em São Paulo, disse textualmente que ela "ficou agonizando por mais de cinco minutos, vertendo sangue e ninguém fez nada, ninguém se mexeu".

Só depois desse longo, eterno intervalo de tempo é que se aproximaram dela e a jogaram como se recolhessem lixo. O ambulante que foi detido no shopping, porque estaria realizando vendas naquele espaço proibido para esse tipo de atividade, teria saído da sala dos seguranças, segundo testemunha, todo ensanguentado e foi carregado com essa indiferença que caracteriza a política de "segurança" do Brasil de hoje.


O cidadão brasileiro é um cachorro morto, só que não sabe. Acha que tem direitos. Compra, vende, vota, casa, tem filhos, faz tudo o que um cachorro morto está impossibilitado de fazer. Por hábito, por insistência, porque quer sobreviver, ser humano. A menina assassinada na favela tinha namorado firme e criava uma criança. O ambulante tinha família. Mas as pessoas que os conheciam só viram a realidade quando a pessoa próxima foi vítima dessa armadilha que é a vida coletiva no Brasil, onde ninguém presta, ou pelo menos, ninguém está liberado para não prestar (é por isso que a televisão repete todos os dias o refrão: "Você não vale nada..."). São todos suspeitos, cúmplices, culpados. Por isso morrer é só um detalhe. A morte já ceifou a nação, e é para esse imenso contingente morto que o presidente ocupou uma eternidade na televisão com sua arenga sobre a Segunda Independência.

Seremos ricos e resolveremos todos os nossos problemas, pois o pré-sal está aí que não deixa ninguém mentir, nem mesmo os mentirosos contumazes. Claro, foi assim quando descobriram nosso ouro, as pedras preciosas, os minérios. Foi igualzinho. Tínhamos enormes jazidas e ficamos milionários. Vai acontecer de novo, acredita? É só ficar pressionando os seus congressistas que eles obedecerão à "opinião pública", como se não soubéssemos das negociatas, das compras de votos etc. Enquanto isso, enfrentamos mais uma onda de violência generalizada - ônibus incendidados, tiroteios a esmo sobre pessoas desarmadas, agitação e brutalidades bandidas e policiais.

Coincidência (não estou insinuando nada): aconteceu a mesma coisa quatro dias depois do pedido do impeachment de Lula em 2006, quando o escândalo do mensalão estava no auge. Bastou atirar por todo o canto, provocar incêndios e tumultos que São Paulo ficou de joelhos, acovardada dentro de casa enquanto os desmandos atingiam o auge. Depois, nunca mais. Por que será? E agora voltam. Por que será? Porque sim, deve ser a resposta. Não devemos pensar em nada além disso. Não é mesmo?

Nós, amadores, só temos a perder com os profissionais. Mentem descaradamente à custa do dinheiro público, deixam o país se transformar num caos e se preparam para fazer como o partido japonês recentemente derrotado nas urnas, que ficou 50 anos no poder, ou o PRI mexicano, que mandou por 70 anos. A idéia a princípio eram 20 anos, agora acham pouco. Querem o poder para sempre. Para isso estão preparados. Gente não vale nada no país. Basta derrubar uns quantos e jogá-los na vala comum da indiferença e do esquecimento. Tão simples assim.

A Pátria está nas mãos de quem bem sabemos. É hora de reagir. Não acredite em propaganda e ligue as ocorrências (e as omissões) do noticiário às intenções eleitorais. Aí tudo faz sentido. Quando perdermos a ilusão de que nos livramos da tirania, poderemos pensar em algo mais consistente.

RETORNO - Imagem desta edição: Andréa Beltrão ao lado de Matheus de Sá no novo filme de Sergio Rezende, Salve Geral, sobre a cidadania em pânico envolvida na onda de violência promovida pelo PCC e seus mandantes em 2006.

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