28 de setembro de 2013

VIAGEM DE PERFUME



Nei Duclós

Viajas por mim com teu perfume. Soltas o pó de fada em meu convite. Dizes sim sem dizer nada.

Passei o dia contigo. Lembrar-te é o meu abrigo.

Já se foi o tempo. O dia sumiu no ralo, deixou de fora os cabelos, nosso balanço do efêmero.

Não tenha medo, o terreno é firme. Só existe nós, universo oculto.

Te mostras fora de foco. Te guardas sob a neblina. O meu olhar se embacia. Vibro com tua chuva.

Me tiras o ar para me deixar no vácuo, onde perco o contato com as leis físicas e matemáticas.

Penso em ti, mas faz de conta que estou ocupado. Quem me vê acha que despacho. Mas sou ministro sem pasta diante de ti, beldade.

Viajaste para o Oriente. Me trouxeste um presente. Tu mesma, glória da vida

Querida que silencia. Cultivas meu sonho oculto. Somos nossa fantasia

Tão pertinha me enchia de mimos. Éramos tão separados. Mas ficou o visgo.

Literatura não faz parte do rodízio. Situa-se onde não fica. Num outro mundo, sob camadas de espelho.

Cada vez que te escuto minhas florestas se agitam.

Complica o verbo sem rumo, esperto nos seus estudos, aprende quando desiste, ensina se estiver pronto.

A noite leva para lugar nenhum, a não ser que o acaso te ponha em meu caminho.

Pulei em ti quando menos esperavas. Estavas distraída com a mesmice dos encontros.
Hora do êxtase. Solte os cachorros.

Vênus agora sozinha curte a solidão do seu brilho no horizonte da noite fria.

Estás perdida. Achei o que procuravas.

Falo por cartazes antigos, rabiscados de versos livres. Às vezes uma palavra cruza uma paisagem que já não existe. E retorna nas mãos de uma surpresa.

Uma hora alguém derrapa na curva. Cai no agito que vira sossego. Mergulho de peito.

Esse grude que dura o tempo todo e volta cheio de calor. Nem sabemos do que se trata, mas é bom.

A tarde voou, no piso liso do tempo. Escorregamos para a noite, com seu vórtice de assombros.

Deus fez o homem do barro e lhe soprou uma alma imortal, a mulher.

Somos como o crepúsculo. Dia e noite quase se tocando.

Tinha esquecido de ser mulher, ela disse. Tua palavra faz misérias comigo. Sei que é sem querer, bandido.

Estás além da minha fantasia. Por mais que eu te invente, voas soberana.

Fazemos tudo ao contrário. Nos submetemos na política e nos revoltamos no amor.

Pouso é compromisso do voo quando decola.

Mulher é que gosta de poesia, disse o machão. Por isso mesmo, disse o poeta.

Deixamos para mais tarde o que nos desperta cedo.

Tenho um coração criminoso, uma psicopatia amorosa: te quero de todas as formas, floração da serra.