5 de abril de 2009

O MITO VOLTA À MINA FUNDA


Reproduzir texto alheio é complicado. Dificilmente faço isso aqui no DF. Quando citam em algum lugar, jamais dão o crédito devido. O que vem a seguir, por exemplo, foi escrito pelo jornalista gaúcho-catarinense Paulo Brito, mais um que demora a publicar seus arquivos. Como mexi com os brios dos sessentões, agora aos poucos eles estão sendo conquistados para a mais prazerosa das artes, escrever as memórias, resgatar o que foi dito e escrito ao longo da vida longeva. Então, repito: o texto seguir é de Paulo Brito e mais ninguém. Combinado? A foto é de um comício de Brizola, não obrigatoriamente em Criciúma. Serve como ilustração.

CRICIÚMA NÃO ESQUECERÁ JAMAIS

Paulo Brito, 1992

"Ao pisar no primeiro degrau do jatinho, Brizola foi agarrado pelos braços de Leonel Pavan, prefeito de Balneário Camboriu e em seguida, nos braços da multidão foi levado e arrastado até a caminhonete que o levaria ao prédio da Prefeitura. Os mais velhos recordavam os tempos de cadeia, da repressão e do fechamento dos sindicatos. Os mais jovens começavam a conhecer a história do trabalhismo. Crianças e mulheres se misturavam na multidão. Todos queriam abraçar, tocar e chegar perto de Brizola. Uma excitação que se espalhava pelas ruas de Criciúma e chegava à praça Nereu Ramos.

Um delírio que tomou conta da cidade desde que foi anunciada a vinda de Brizola à Criciúma. Nos círculos de pessoas que se formavam em torno das obras do palanque, velhos e moços misturavam-se recordando o passado de luta do trabalhismo. Um senhor de 40 anos mostrava a Doutel de Andrade um rascunho sobre a vida de Brizola e pedia para que o partido financiasse a publicação, pois acreditava:

- “Ninguém conhece sua vida. Eu conheço. O que escrevi vai acabar com as especulações de que Brizola fugiu do país vestido de mulher. Ele, na verdade, saiu vestido de brigadiano”.
Do comício na noite anterior, as pessoas só falavam da violência dos seguranças; dos ovos jogados em Collor de Mello e no “Careca”; dos bastões de choque; do gás lacrimogêneo e do desrespeito do candidato da direita com a imprensa.

Ansiosas, as pessoas, queriam entregar bilhetes; relembravam os tempos do Grupo dos 11; do tempo de prisão, das torturas. “Pinicilina” falava com orgulho das conspirações contra o regime militar e orgulhoso exclamava:

- É o nosso líder e podemos voltar a falar, criticar sem que os “gorilas” nos tirem das ruas.
Como “Pinicilina”, Criciúma queria lavar a alma. Os mineiros queriam ver e abraçar Brizola. A história de antes, que não foi apagada pela ditadura, era lembrada a cada momento nas ruas, nos bares e na praça, enquanto o coreto era arrumado para o grande comício do dia seguinte. Uma festa que Criciúma jamais esquecerá. Uma festa que só o Metropol sabia fazer, nos anos 60 quando ganhava todos os campeonatos de futebol.

O povo nas ruas e na praça recuperava a história. A história do trabalhismo, arraigada na alma daquele povo e ressurgirá entre os mais jovens.
- Como presidente da República vou dar continuidade ao governo de Getúlio.

Uma frase histórica. A frase mais aplaudida pelo povo na praça. A vinda de Brizola, o trajeto do aeroporto até o centro da cidade era saudado a cada instante, a cada momento. Quando ele chegou o povo se dividia entre o aeroporto e a praça. A distância era muito grande, caso contrário Brizola teria sido carregado nos ombros do povo do aeroporto até a praça Nereu Ramos.

Nas calçadas das ruas e avenidas, as pessoas aplaudiam, outros, afoitos, aproximavam-se da caminhonete, como transtornados, tentando tocá-lo. Na Prefeitura, a multidão pegou Brizola nos ombros e o colocou em cima do caminhão. Lentamente a caravana conseguia passar, homens queriam subir na carroceria, impedido gritavam:
- Eu estive preso por causa dele. Me deixa subir -, imploravam.

Devagar a comitiva se deslocava, mais de mil carros formavam o cortejo, que hoje chamam de carreata. O caminho parecia longo. Devagar, Brizola foi chegando, cumprimentando o povo. Mary Terezinha parou de cantar e a multidão que se encontrava na praça desde o meio dia, pôde ouvir o que queria ouvir. Foram mais de quatro horas de espera, mas ao final - sem ovo, sem vaia, sem seguranças e sem violência - o povo voltou para casa feliz. "

Paulo Brito
Criciúma 1992

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