7 de agosto de 2004

ERA UMA VEZ O JORNALISMO

O jornalismo brasileiro nasceu inglês (no que este tem de melhor, pois nosso Correio Braziliense era um Times dos trópicos), e agoniza americano ( no que este tem de pior, pois chegou-se ao consenso, com exceção de alguns cadernos culturais, que jornal é feito para olhar e não para ler). O resultado é a demissão em massa na Folha, onde 200 foram para a rua. Ou o jornalismo impresso volta a ser vanguarda (e não vanguardinha pseudo-cool), ou acaba de vez.

O QUE É VANGUARDA? - Vanguarda é a reportagem exclusiva, desvinculada de qualquer interesse mais forte. É a dedicação total do repórter e o respeito do editor. É o dono de jornal não meter as patas na redação e fazer como o velho Breno Caldas, que tinha um recorte do seu Correio do Povo preso na mesa pela tampa de vidro. Breno Caldas tinha uma resposta pronta quando alguém ia reclamar de alguma coisa publicada no jornal maior do Rio Grande, aquele que nasceu para refletir a união gaúcha e a soma dos pequenos jornais políticos da República Velha e que assumiu, depois da revolução de 30, a função de um jornalismo moderno e acima das picuinhas locais. ?Veja só, nesse recorte está algo que eu discordo e é exatamente contra mim?, dizia, mostrando o pequeno texto que algum repórter, ainda não totalmente impregnado pela cultura do velho Correio, tinha assacado, com o apoio distraído do editor. Claro que era uma boutade do grande Publisher, mas pelo menos havia essa cultura de que redação era de responsabilidade dos jornalistas, e diretor de redação era um cargo para jornalistas e não para parentes do patrão. Ainda não existiam as inúmeras faculdades de jornalismo, que despejam pessoas que fazem qualquer coisa por uma colocação, até mesmo trabalhar de graça. Não existiam os manuais de redação, pois naquele tempo haviam escolas do mais alto nível. Estudava-se português a fundo, além de Latim, Francês e Inglês. O sucateamento da educação provocou o analfabetismo funcional e os jornalistas que se formam ficam na mão da pata dura da mentalidade de negócios que tomou conta do ofício.

DE REPENTE, BLUMENAU - O ônibus parou numa rua arborizada. Parecia ainda a estrada do Vale do Itajaí e fiquei lá dentro, esperando que a viagem prosseguisse. Mas eu já estava em Blumenau. A cidade-aranha, que tinha um centro com várias pernas-ruas que se ramificavam e iam subindo morros e alcançando as periferias, mostrava-se absolutamente inédita para mim, criado na linha reta de Uruguaiana e no fervilhar portoalegrense dos 60 (meninos, eu vivi aquela cidade que explodiu no meio da rua). Fui então para a redação do Jornal de Santa Catarina, onde Nestor Fedrizzi me esperava, tentando montar uma redação. Não existiam jornalistas de sobra e ele fez um anúncio na redação da Zero Hora oferecendo o dobro do salário para quem topasse a aventura. Deixei a vida de estudante para trás, depois de ter passado um período na Folha da Tarde da Caldas Junior, onde fui foca selecionado em concurso. Trabalhei então com Mario Medaglia, José Antonio Ribeiro, o Gaguinho (diretor de redação, que já partiu para o Outro Lado), Sergio Becker, Paulo Becon (colunista), Virson Holderbaum (redator como eu), Renan Ruiz (arte), entre outros. Morávamos, os gaúchos, numa enorme casa ao lado do jornal, a qual chamávamos de Mansão. Nos primeiros dias, fizemos um movimento para conseguir ajuda de custo para a nossa mudança, pois estávamos, para variar, completamente duros. Isso provocou grande mal-estar e aquela equipe não durou mais do que um ano. Fui o primeiro a levantar vôo. Aquele jornal a qual chamávamos de JSC hoje é apelidado de Santa e é de propriedade, pelo que sei, da RBS. Essa foi a primeira vez em que assumi a aventura do jornalismo, essa profissão que tudo me deu e hoje passa por duro teste de sobrevivência.

NA LAPA - Foi Humberto Werneck numa palestra que apontou a saída para a crise do jornalismo: a reportagem. Autor de livros-reportagem, Werneck faz parte de uma elite fora das redações principais que mantém viva a atividade, que dele sempre recebeu as mais duras críticas. Nei, me dizia ele, você conhece algum lugar chamado Lapa que seja bonito? Veja a Lapa do Rio. Agora me diga: um lugar chamado Lapa de Baixo, tem chance? Era assim, com essa soda cáustica no humor, que cruzávamos os longos invernos no galpão da Editora Três, onde passei os mais produtivos anos do meu jornalismo particular. A mais notória piada de redação daqueles tempos era a chegada do Elio Gaspari na Veja. Como todos os editores estavam deitados na sopa de uma revista bem sucedida, diziam que só se ouvia o barulho da máquina do Renato Pompeu. E assim mesmo, esse último baluarte caiu quando Renato acabou o romance dele. Renato Pompeu é um escritor magnífico e, claro, não faz parte desse tamborete onde se aglomeram alguns famosinhos escritores da moda. Basta ler Quatro Olhos para ver o que é texto. Esse é o nível dos jornalistas brasileiros. Precisamos recuperá-lo. Basta contratar o talento, dar-lhe esse insumo básico, a liberdade, e lutar até a morte para publicá-lo. Um jornal assim será copiado por todos os sites do país. Vamos ser jornalistas, vamos ser heróis.

RETORNO - Tony Monti foi fundo no debate sobre a letra do Hino Nacional aqui no Diário da Fonte. Esperneei, contra-argumentei e no fim agradeci essa valiosa colaboração. Costumo saber o que penso quando escrevo livremente. O retorno me ajuda a esclarecer melhor o que penso e até mesmo a reavaliar o que escrevo. Ou a revisitar o assunto ou a insistir no que disse. Insisto: nosso Hino é o máximo. Mas ninguém é obrigado a gostar.

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