24 de maio de 2013

TEMPO É ABISMO



Nei Duclós


Te toquei quando enfim pegaste minha mão.


Esse é o momento em que nos entregamos sabendo que o tempo é abismo e a única coisa real é o que nos gruda em sonho mútuo.

Invento frases para fisgar andorinhas. Mas elas são ariscas e preferem sílabas.

Não quero mais nada comigo.

Estarei ocupado no fim de semana. Vamos adiar para hoje.

Bom dia, poesia, que despertas no teu íntimo. Bom dia para que haja vida. E se suceda o milagre, tão comum quanto explosivo, o de habitar o mesmo verbo, canteiro de especiarias.

Não lembro o motivo do nosso ruído. Só do beijo que acabo de não te dar por causas desconhecidas.

É de manhã, criatura solar. Dispa a noite que te vestiu no abraço bruto do amor que afasta o frio.

Temos uma lembrança que nos realimenta. Brasa que acende o resto do fogo.

Estávamos na mesa. Você falou com todas as letras. Ainda estou surpreso, o lento assimilar de espanto.

Diga logo o que não está pensando.

Sua opinião é muito importante para nós, pois temos a chance de ignorá-la.

Debruço meu rosto sobre tua imagem multiplicada mil vezes por espelhos paralelos. Assim posso concorrer com as estrelas.

O amor mandou dizer que não está.

- Está querendo me seduzir? ele perguntou.
- Já te seduzi. Estou só fazendo a manutenção, disse ela.



RETORNO - Imagem desta edição: foto de Kate Oberreich.