12 de fevereiro de 2011

TROPA DE ELITE 2: NINGUÉM ESCAPA


Nei Duclós

Achei fria a reação da crítica em relação a Tropa de Elite 2, como seu assombroso sucesso popular fosse uma espécie de vírus a ser prevenido pela vacina da indiferença bem pensante de quem assiste tudo de camarote. Precisei esperar o filmaço de José Padilha chegar aqui no ermo onde moro para enfim saber o que aconteceu com o capitão Nascimento, essa criação magistral de Wagner Moura, o grande ator brasileiro da atualidade e que está sendo dispersado pelo massacre publicitário quando deveria estar brilhando numa carreira internacional. Mas Tropa de Elite 2 merece a fama que tem.

Prefiro vê-lo como a soma de dois gêneros, o thriller político e o filme policial noir, sem querer enquadrar sua narrativa didática e profunda, apesar de ter gente que achou ser uma história rasa, de uma superficialidade proposital para agradar a massa. Ao contrário. A trama é fruto de uma síntese bem elaborada de uma realidade política tratada com elementos de ficção. Nascimento comanda uma operação de repressão da revolta no presídio Bangu 1, que resulta em morte de grandes traficantes. O povo aplaude, mas os direitos humanos caem em cima e ele é então afastado do Bope e, como fica famoso, vai parar na secretaria estadual de segurança do Rio. Lá, descobre que o governo do estado, a própria secretaria onde trabalha e os políticos são os comandantes da corrupção e dos massacres.

Por que é policial noir? Porque todos os elementos estão lá. O protagonista solitário, líder no seu ofício, afastado de suas funções, acaba enxergando melhor o sistema a qual pertence. Conta então sua história com o distanciamento do anti-herói que tudo vê com clareza e transmite suas impressões com frases certeiras. É separado de uma mulher que casa com seu principal adversário. Tem problemas de relacionamento com o filho. Perde na luta seu melhor amigo e parte para a vingança. Termina incorporando toda a lucidez amarga de alguém que nada pede em troca e coloca o dedo na ferida. A narrativa em flash back é outro elemento noir magnificamente incorporado no filme.

Por que é um thriller político? Porque mostra como a corrupção policial eliminou os traficantes para faturar não apenas com as drogas mas com todos os negócios da favela. Porque mostra a dependência dos políticos em véspera de eleição em relação aos chefes da máfia que dominam as comunidades. Porque mostra as ligações da mídia com a corrupção, como o deputado que tem programa sobre violência policial e ganha parte do butim arrecadado. Porque mostra o cerco aos trabalhos e cidadãos honestos, desde o idoso que precisa de gás na favela até a jovem repórter que tenta denunciar os crimes. E porque trata da guerra, onipresente, em sequências antológicas de tiroteios e mortes.

Temos assim o mesmo insight de o Poderoso Chefão III, quando o mafioso descobre que a máfia maior era o próprio poder político e financeiro institucionalizado e que ele e sua organização não passavam de um apêndice, de um coadjuvante do processo todo. Nascimento enxerga claramente que fazia parte de um sistema que precisa matar para manter-se no poder e faturar alto. Enquanto ele e outros policiais vocacionados arriscam a vida e a família, os manda-chuvas manipulam os eventos sem a mínima preocupação com quem morre.

O povo entendeu o recado e lotou as salas de cinema e comprou e alugou os DVDs. Não porque torça pela polícia matadora, mas porque admira a coragem de quem fala o que vê e sente, porque está farto de tanta corrupção e violência e porque precisa entender onde está metido até o pescoço. O povo agradece a José Padilha pela sua obra brilhante.

Tropa de Elite 2: pega um, pega geral. Ninguém escapa.


RETORNO - Imagem desta edição: Wagner Moura, o ator exato.

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