27 de abril de 2010

TEMPO CERTO


Nei Duclós (*)

Crônica que usar a data como tema corre o risco de se repetir no ano seguinte. Natal, Mães, Índio, Tiradentes, Páscoa: a sucessão de efemérides exauriu a capacidade de invenção de alguns autores, que agora fogem do chamado “gancho”, num movimento libertário ainda não reconhecido. Eles se opõem à catilinária dos catequistas, que a cada marca do tempo despejam a sabedoria de ocasião.

É bem melhor falar de peixes quando há deserto, ou de vulcões quando dá praia. Os escribas insurretos não se confundem, porém, com os repetitivos anticlericais que acabam comendo carne no dia Paixão, pois esse gesto é tão batido que já foi absorvido. Preferem algo mais radical, como esquecer o Dia do Jornalista para falar de algo mais profundo, como a perda do jogo de botões na mudança da família para a capital.

Lá ficaram os craques de plásticos jogados num canto, sendo varridos pelos novos donos, indiferentes como carros de passeio passando rapidamente por vendedores de frutas na beira de uma estrada remota. Quem irá recolher o tabuleiro abandonado de um jogo milenar de damas, que pertenceu aos ancestrais vindos da Ucrânia, depois que completamos os 18 anos regulamentares e sumimos para sempre na voragem da vida adulta?

Esses são os temas que ocupam os escrevinhadores avessos aos desfiles e procissões. Eles contam outras histórias que passam ao largo de avenidas engalanadas e passeatas comemorativas. A realidade não é o marketing da notícia, o tempo certo de criar ou chorar. Há uma quarta-feira de cinzas nas férias de verão desses implicantes batucadores de teclados. Há uma ascensão solar na madrugada de veludo dos inspirados letristas fora da vida social.

Eles vivem no ermo absoluto, lá onde o arco-íris se refaz da sua arquitetura de abóbadas. São os pintores de néon que fecham a aliança entre as pessoas e seus desígnios e memórias. Possuem chaveiros confusos, bolsas que jamais abrem, meias de tamanhos diversos que nunca formam par. Eles se espantam com os pássaros quando todos estão atentos aos discursos. Colecionam abraços quando há atropelo. E jogam a isca para o amor, arisco por entre as gentes. Alguém há de cair enredado por essa mística.

Eles possuem o tempo certo que escapa ao calendário. .

RETORNO - 1. (*) Crônica publicada nesta terça-feira, dia 27 de abril de 2010, no caderno Variedades, do Diário Catarinense. 2. Imagem desta edição: Esperando pelo Trem, trabalho em naquim e photoshop de Ricky Bols.


CESAR E RENZO: DOIS EVENTOS OBRIGATÓRIOS



Meu amigo Cesar Valente, prestigiado jornalista brasileiro de Florianópolis, lança seu primeiro livro nesta quarta-feira, dia 28. Compareça. De Olho na Capital é uma seleta de textos saborosos sobre fatos e histórias do lado de cá do mundo e também uma geral do autor do que ele sabe fazer como poucos: escrever com segurança e talento, fisgando o leitor pela descontração das palavras e a responsabilidade do que é divulgado.


Meu amigo Renzo Mora, mestre da ironia, do humor escrachado e fino ao mesmo tempo, um criador na maré alta da cultura pop e um profissional de primeiríssimo time, ensina Como criar roteiros publicitários que funcionam. Renzo é do ramo. Escritor hilário, tem três livros publicados, um sobre Sinatra, outro sobre o Cool e mais um sobre filmes ruins (o que rendou excelente entrevista no Jô Soares). Inscreva-se no curso dele. Você só tem a ganhar.

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