26 de junho de 2008

AS PIORES PERGUNTAS DO MUNDO


Perguntas recorrentes, que costumam nos atormentar, fazem parte do pior do convívio humano. São uma espécie de anteparo para a conversa que deveria ter consideração e expõe apenas indiferença, muitas vezes desprezo. Lembrei de algumas.

VOCÊ TRABALHA? – Essa é mortal. Significa: admita, ouvi falar, estou vendo, você não trabalha, ou seja, não faz parte do mundo produtivo, é um vagabundo, deixou-se ficar, é looser, foi demitido e não consegue recolocação, não construiu uma carreira (assim como ele ou ela, a pessoa que pergunta), não participa do fomento financeiro do sustento, é um pária, por que continuas vivo se não mereces? Quando te perguntarem “você trabalha?” responda: “Não, mas costumo comer muito cu”. É tiro e queda.

TE ACORDEI? – A pessoa telefona para tua casa e pergunta se estavas dormindo. Significa o óbvio: quem pergunta está há horas acordado enquanto dormes a sono solto, irresponsável e ridículo. Mas quem telefona está fazendo um bem para você, está tirando você dessa modorra sem sentido que é sua vida e inoculando um pouco de anima, alma, para poderes sair da posição de verme para o de, pelo menos, escravo. É como dizia a mulher do sambista: acorda e vai trabalhar que já passa de 1930. Se perguntarem “te acordei?” responda: “Sim, estava só esperando um imbecil me despertar”.

É MENINO OU MENINA? - A cretinice adora fazer essa pergunta diante do teu pimpolho. A criança está expondo seu gênero em roupa, maquiagem etc., mas o canalha acha que pode ser engraçadinho colocando em dúvida se tão formosa menina não passa de um garoto ou tão explícito guri talvez seja no fundo guria. Significa que o filho está repassando a dúvida herdada do pai. O animal está chamando você de viado, é isso. Ou quer provar que os pais não conseguem manipular os sinais convenientes para definir o sexo dos anjinhos.

POR QUE VOCÊ ENGORDOU? – Há muitas respostas para essa pergunta, todas elas malcriadas, desaforadas ou ofensivas. Mas tem uma que é um míssil: “Engordei porque comi tua mãe. Meu bucho não conseguiu digerir a véia”. Tente. Mas diga isso armado.

O QUE VOCÊ ESTÁ FAZENDO AQUI? – Sabemos o significado da pergunta. Quem deveria estar aqui é o perguntador, não você. Ele é que é, ele que merece estar nesse local privilegiado. Você não tem nada a fazer ali. Você, portanto, deve explicações, já que nada justifica a sua presença. E se você está aqui é porque alguma você vai aprontar. Pedir alguma coisa, por exemplo. Derrubar vinho caro no chão. Tentar puxar conversa com o presidente. “Vim cuidar da minha carrocinha de cachorro-quente” é uma boa resposta. Reforça o perfil de um pobretão marginal, deixando a pessoa ao mesmo tempo satisfeita e confusa.

JÁ TE APOSENTASTE? – Há muitos anos que escuto essa pergunta. Como não cheguei aos 60, a resposta, bem educada, é não. Mas dá vontade perguntar por que tanto interesse. Certamente é porque a pessoa quer te chamar de velho imprestável e não sabe como. Aliás, há sempre uma nova maneira de te chamar de gordo ou velho. Ficaste forte. Queres que eu arrede mais a mesa? Você consegue passar? Será que você cabe? O senhor tem oitenta anos? Agora eu entendo aquele senhor muito distinto de Uruguaiana, que ao fazer noventa anos começou a sacudir seu grande cajado com a janela aberta, chamando a atenção dos maledicentes. "Vão se roçar numa tuna", como se diz por lá.

RETORNO - 1. Aviso aos navegantes. O Diário da Fonte tenta fazer justiça e defender as vítimas do pesadelo da linguagem. Não significa que eu me enquadre entre os sofredores o tempo todo. Para fazer este post, por exemplo, consultei minhas bases para levantar cases. Se você tiver alguma pergunta indecente para lembrar, diga para nós que a gente inclui. 2. Imagem de hoje: Dias Felizes, foto de Clovis Heberle, em que apareço, super-gurizão, no Imbé, de férias, de camisa amarela, remontando pandorga com meus filhos Daniel e Miguel. Fotaça que eu não conhecia e que foi resgatada por Clovis, esse cara magnífico que esta sempre conosco. Por que está neste post? Para lembrar que somos a soma do tempo e que jamais poderão nos enquadrar.

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