11 de março de 2004

A IDADE ADULTA DO BLOG


Foi Marcelo Min o pioneiro que deu o alerta para que surgissem o Espinha e Outubro. Jornalistas que não se enquadram na atual fase das redações (que, fico sabendo por Gim Tones, fazem balanço diário de “furos” em cada editoria) transformaram esta nova mídia num exercício completo de tudo o que foi aprendido. Forçamos, junto com muita gente, algo que não estava no gibi: conseguimos atingir a idade adulta do blog.

AUTORIA - O importante não é o blog, é o seu autor. Ferramenta como outra qualquer, o blog não pode ser mitificado nem execrado, como acontece normalmente. Gostei do despreendimento de Hélcio Toth, que deu adeus ao Espinha do seu jeito: pedalando e rindo. A cabeça feita do nosso artista nos ensina a não ficarmos presos ao que conquistamos. Mesmo nossas vitórias podem ser pesadas correntes. Marcelo Min também já tinha demonstrado essa mesma postura quando seu dinâmico, genial e imprescindível Fotogarrafa tornou-se para ele quase que uma compulsão diária. Seu talento e marginalidade estavam sendo devorados pelos leitores afoitos. Pois vão fazer seus blogs! parece-nos dizer. Sejam também produtores, sejam fotógrafos, artistas, escritores! No fundo, a Internet conseguiu viabilizar um velho sonho: o da criação individual sendo colocada à disposição do público sem intermediação nenhuma. Mas essa vantagem mostra-se agora ilusória. Existe, sim intermediação, que começa a mostrar as garras. Isso não quer dizer que a liberdade na rede esteja acabada. Mas sim que a Internet obedece às injunções de sempre. E que a liberdade depende da força e importância da nossa reação.
O conflito deve ser trabalhado como insumo para a maturidade, e não para a desistência. Uma busca rápida no Google nos revela uma série de depoimentos sobre a briga atual dos blogs com seus servidores – matéria magnífica que já deveria estar estampada em todos os jornais, se houvessem mais pauteiros eficientes e editores fora da rotina na grande imprensa. Escolho a esmo um desses depoimentos, intitulado Casa nova, publicado no final do ano passado: “Mudei o blog de endereço mais uma vez. O motivo é simples: a partir de janeiro de 2004, os serviços do blogger e kit.net ficarão disponíveis somente para clientes do provedor da Globo.com. Mas já estava interessado em mudar de servidor já tinha um tempo, pois o kit.net não permitia que pessoas de fora do Brasil acessassem o site. (marlborocity.topcities.com/dezembro2003.htm - 68k)”. Ou seja, já existia o aviso e agora a coisa estourou. O estrago que está fazendo, podemos adivinhar. Ou então, fazer uma boa reportagem sobre o assunto.

RED ACTION? - Esse trocadilho é do Lindolf Bell, numa dedicatória que me fez lá por 1971, em Blumenau. Eu achava um escândalo que o novo jornal da cidade, o Jornal de Santa Catarina (que na época era JSC e hoje chamam de "Santa", o que é horrível) não fizesse um convite ao grande poeta da terra para participar do novo projeto. Bell ficou emocionado e tornou-se meu amigo. Achava nossa redação bastante contundente e linkou a palavra redação com "ação vermelha", o que é de uma graça sem par. Achávamos que só numa redação tradicional poderíamos ser "jornalistas" - e isso incluía as redações alternativas, de pequenos jornais de oposição. Hoje sabemos que um jornalista de verdade, mesmo afastado das redações tradicionais, consegue superar o muro que o leva para longe do que todos acham ser o exercício profissional normal. A experiência que consegui desenvolver na Fiesp por cinco anos na revista de lá, quando Toth e Min cravavam capas históricas sobre o fazer no Brasil – o chão de fábrica – é um exemplo do que pode ser feito para enfrentar as imposições. Claro que havia todo o tipo de interferência, mas para isso servem os adultos: agir estrategicamente é uma maneira de sair da infância e fazer História. O grande problema é o silêncio: enquanto fui editor da revista Notícias Fiesp/Ciesp, houve citação zero na imprensa sobre o veículo, apesar de nossas matérias surgirem, milagrosamente, em vários jornais e revistas, sem que jamais alguém citasse a fonte.

GÁS - Outra saída é a própria Internet. Jornalismo de primeira é feito na rede. Basta ver o portal Nomínimo por exemplo, ou a revista Sagarana, ou a Comunicação e Cultura. Hoje, a crítica contundente está a cargo dos sites e blogs, que conseguem veicular com liberdade (e isso implica grandes responsabilidades, especialmente com a qualidade, a transparência e a sinceridade do que é dito). A paranóia pode apontar sinais evidentes de que também está sendo minado esse espaço conseguido à força (já que cercaram a rede de toda espécie de preconceito, tanto na chamada “comunicação” – estou farto dessa palavra – quando na universidade). Vi gente falar mal da rede em plena sala de aula da mais conceituada universidade do país, e não eram alunos não, eram catedráticos. Adaptaram velhas teorias ao fenômeno emergente. Outros, que ainda não dominavam as novas ferramentas, sentiam apenas inveja de quem estava na vanguarda. Agora que os espaços de luminares começam a ocupar a rede, talvez a poeira baixe. Mas o que vale são os pioneiros, os que ocupam o front antes de todos. Agora que estão chegando as instituições, talvez seja hora de dar uma volta por cima, criar alguma outra ruptura radical. Pode ser dentro da rede mesmo. Estamos atentos e cheios de gás.

RETORNO - 1. Mas blog não é apenas jornalismo. É diário, é literatura, é qualquer coisa que se queira. Essa liberdade continuará, criando sempre novos parâmetros e possibilidades. A liberdade dos outros nos ensina, todos os dias.
2. Anderson Petroceli cria uma nova formatação para o Cantinho do Poeta no Portal Uruguaiana. Os poemas que fiz sobre fotos dele estão lá. Achei mais do que um novo site dentro do grande portal da fronteira. Achei uma homenagem. E mais do que isso, uma condecoração. Vejam lá: ficou demais! Um trabalho a dois que se debruça sobre uma paisagem eterna e histórica, que tenta decifrar o que aquele canto do planeta nos sugere por meio da memória, da inspiração e da liberdade do olhar.

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