7 de abril de 2014

OUÇO ESTRELAS






Nei Duclós

Ouço estrelas, cheiro ventos, tateio nuvens, saboreio a lua, vejo teu sonho.

Sou tímido. não posso dizer o que flutua em meu céu sem nuvens. Aves em rodopio, ameaças de neblina, cores do crepúsculo.

Quem sabe me recebes no teu sonho de brisa. Paredes de pé alto, lagoas que te cercam, praias que tua presença valoriza.

Tanto tempo para chegar ao chão onde pisas. Ali onde brinco de te conhecer inteira.

Abriremos as janelas para o mar. Nossa alma voará, junto com os pássaros.

Farás do teu refúgio a espera por meus braços. Chegarei com o vento, cheio de mel e silêncio.

Fugi da cidade para te encontrar vibrante no ermo que vestiste com teus planos femininos.

Beijo imaginado, olhar imerso em naufrágio, distancia de ti, próxima como a flor mais rara.

Não sabes o quanto mexes comigo, sereia inacessível.

Curto o sonho proibido. Teu gesto na areia, impulso de flor em vida.

Flor, mar, pássaro: paisagens imaginadas impregnam o olhar. A beleza resiste, como um sinal.

Tenho sempre uma resposta na ponta da sua língua.

Eu estava só passando mas fui fisgado pelo teu ficar.

Convívio é arte. Profundeza light. Alegria de superfície, revelação de subsolos.

O QUE PRECISA SER DITO

O que precisa ser dito nem sempre escolhe as melhores palavras. Parece um verso tosco a seta sobre o alvo.

Te prejudico. Para deixares de ser esse desperdício.

Perdemos o amor, não achamos mais. Voltamos ao exílio, nosso eterno lugar.

Não estou pronto, disse o recruta. Ficarei, quando estiver morto.

Não construo nada, prefiro a arquitetura desenhada pelo voo.

Não queria feri-la, apenas provar o mel que me oferecia.

Liderei um movimento contra tua tirania. Decretaste o AI-5. Reagi, mas baixaste a censura à imprensa. Quando veio a anistia, eu já estava em outra.

Você é um encanto quando quer ser ofensiva. Na carícia também.

Aprendi uma língua estrangeira: a que pronuncias quando me queres.

É ASSIM QUE FUNCIONA

É assim que funciona. Começo e não paro. Termino piorando.

É assim que funciona. Te entregas por nada, me tens por ser toda.

É assim que funciona. Quando fugires, será meia noite.

É assim que funciona. Te mandas depois que eu te desmancho.

É assim que funciona. Um dia é vazio, o outro emociona.

É assim que funciona. Uma noite me esquece, na outra me esconde.

ELE, ELA

- Já vai? disse a raposa de olho no pássaro. O inverno nem chegou!
- Não faço turismo sazonal, migro para sobreviver, disse o emplumado escapando rapidinho.

- Escrevo para esquecer, disse o poeta no bar.
- Eu bebo para escrever, disse o bebum.

- Não se aproxime, ela disse.
- Como posso? Estou a mil quilômetros de você, disse ele.
- Pois então tenha cuidado. Não se aproxime senão vou gritar.



RETORNO - Imagem desta edição: foto de Marga Cendón.