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23 de março de 2009

ÁGAPES VERBAIS


O articulista da Folha, Fernando de Barros e Silva, aproveita algumas mazelas nacionais para cuspir no país que o gerou e embalou. É moda. Todos querem tirar um toco do País antes de se mandar para o Primeiro Mundo. Barros, na edição desta segunda-feira, dia 23/03/09, acha que o Senado teria “desvirtuado” o projeto original de Niemeyer e que a “aposta” do arquiteto “foi sendo devorada pela profusão de anexos, de salinhas obscuras, de corredores acarpetados e paredes aveludadas. O cortiço cafona que funciona sob o esqueleto da utopia moderna parece selar um destino histórico.” O Senado assim é a “alegoria cômica do país tacanho, corrupto e atrasado que não dá conta dos excessos da realidade, não obstante a atualidade da obra de Dias Gomes quase 40 anos depois da sua consagração.”


A aposta original de Niemeyer era construir um mausoléu da democracia, afastada da opinião pública, que fizesse a glória das empreiteiras, que se locupletaram na transferência irresponsável da capital. Portanto, ela não foi sendo devorada, ela foi cumprindo seu destino. O país não é tacanho, corrupto e atrasado. Quem é tacanho, corrupto e atrasado é o poder que tomou conta do país desde 64 e mantém sob o garrote vil uma população que se amontoa em favelas e cortiços e cada vez mais perde as chances de encontrar meios de sobrevivência. Esse poder, identificado com o país, é apoiado pela mídia que o articulista tão bem representa.

Diz Barros: “A total desconexão dessa política com a sociedade diz muito da distância entre o projeto original de Brasília e o que ela representa hoje - do abismo entre o que a capital quis ser e o que se tornou.” A capital era para isso mesmo. JK, o sorridente, precisava tirar a capital do Rio de Janeiro, que se transformou na capital do Brasil Soberano com a vitória de Vargas, lugar onde o trabalhismo deitara fundas raízes e permitia a continuidade no regime que conseguiu implantar um mínimo de equilíbrio entre capital e trabalho. Vargas inventou um parque industrial, uma elite financeira e industrial (Moreira Salles e Ermírio de Moraes surgem no seu governo) e uma massa de trabalhadores bem remunerados, representados com sindicatos e centrais sindicais com poder de barganha. Brasília se tornou o que pretendia ser: um enclave do Estamento, longe das pressões da sociedade.

Dias Gomes não obteve consagração, simplesmente sua obra foi veiculada pelo monopólio televisivo, que usa o horário em que as pessoas obrigatoriamente estão em frente à TV. Substituiu a esposa, Janet Clair, que era dona do espaço. Ajudou a compor a imagem perversa do país, que foi destruído pelo sistema político e financeiro sustentado pelo monopólio de comunicação. Além do mais, é uma obra chupada e desvirtuada de uma das obras culturais da revolução de 30, o romance social, que explodiu logo após a ascensão de Getúlio Vargas ao poder. Achar que Dias Gomes (que clonou Zé Lins do Rego, entre outros) é coisa é o mesmo que achar que Luis Gonzaga inventou a sanfona.

A vocação histriônica de Barros e Silva pode ser detectada quando sugere uma Subsecretaria da Jenipapança para o Senado ou uma Secretaria das Explicações Surreais, ou quando chama um senador de Heráclito, o Fortes. O trocadalho em cima da aparência demonstra não apenas preconceito contra pessoas obesas ou de sobrepeso, mas revela o baixo nível de criatividade dos pseudo produtores de pensamento, que ao chutar cachorro morto (o Senado flagrado no excesso de mordomias) tenta encontrar um lugar para a posteridade.


Barros aproveita ainda para desancar o serviço público (na figura do “barnabé abnegado”) e instaura Sucupira, a cidade imaginária do grotão brasileiro de Dias Gomes, como a capital do país. Sucupira é a anti-Nova York, a cidade imaginária onde vive Barros e sua troupe. Eles sentem vergonha do Brasil. Se acham cultos, sofisticados, progressistas, democratas e ínclitos catequistas da moralidade. Nos seus ágapes, devem sorver vinhos caros fazendo biquinho e levantando o mindinho. Slurrrp. Puxa, como é formidável ser civilizado. Quando o pilequinho toma conta, eles vertem novos conceitos como o já mal-afamado “ditabranda”, que significa: ditadura no dos outros é refresco.

RETORNO - 1. Imagem de hoje: o povo brasileiro constrói a própria tumba. 2. Ontem, domingo, no Fantástico, a internet é apresentada como mera coadjuvante da televisão. É o medo que eles tem da opinião pública. O apresentador fica em frente a imagens interativas e deita falação como um professor de cursinho. Estão nos preparando para o vestibular: agora passear cachorro precisa de MBA.

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