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4 de fevereiro de 2016

HITCHCOCK E HOPPER: TOTAL IDENTIFICAÇÃO



Nei Duclós

Hitchcock era um fã absoluto de Edward Hopper. Toda sua obra está colada no mestre da solidão.  Edward Hopper fazia cinema e Alfred Hitchcock pintava quadros. O foco principal da obra dos dois gênios é a solidão.  Este site mostra a total identificação entre eles, a sobreposição das imagens aparentemente diversas fica clara e inegável. Hitch filmou Hopper o tempo todo.


 Minha descoberta foi tardia, depois de ver pela décima vez O Homem Que Sabia Demais. Fiquei invocado com a sequência memorável da aproximação de James Stewart na capela onde está seu filho sequestrado. As ruas vazias, as casas rígidas em suas cores dominadas por uma sinistra neutralidade, o terno e o chapéu do protagonista dentro de um cenário de abandono e dúvidas. Selecionei duas fotos, uma do filme e outra de um quadro de Hopper para ilustrar essa percepção.




Os filmes de Hitch são uma sequência de outsiders: o médico cínico que receita antidepressivos para a mulher ingênua e está de férias no Marrocos e acaba sendo vítima de uma trama internacional; o fotógrafo expulso do seu ofício devido a um acidente profissional e que fica imobilizado observando a vizinhança, onde se desenvolve um crime; o solitário que se afasta de tudo e todos e enfrenta a fúria dos ex-inocentes pássaros; o delinquente isolado  que se fantasia com as roupas da mãe para cometer assassinatos; a mulher de dupla face que leva o admirador que sofre de vertigem para o alto do campanário; a ladra com problemas psicológicos. Os personagens principais de Hitch sofrem da mesma síndrome de Hopper, são observadores de cenários vazios e acabam se envolvendo no deserto que parecia estar fora deles. São, antes a expressão acabada do lugar onde vivem, onde estão gravadas as formas impressionantes de uma arte sem concessões.

As paisagens ocas e inóspitas, o casarão no alto do morro, a igreja no subúrbio, a capela com o pastor sinistro são como as paisagens de Hopper, que nos fisga pela força da criação e a dureza do olhar rigorosamente clássico numa cena que é a véspera do horror. É tudo tão rígido e genial que Hitch resolve brincar com sua maestria. Tenta até fazer comédia pastelão quando filma a cena do taxidermista, uma pista falsa que acaba em sururu digno dos irmãos Marx. Suas breves aparições, marca registrada do autor, são também momentos lúdicos que abrem brechas no clima opressivo das narrativas.

Ele podia se dar a esse luxo, proibido para Hopper, que conta apenas com um frame para mostrar tudo o que imagina e vê. Mas sua obra é tão intensa que a aparente imobilidade de cenários e personagens acaba virando cinema puro e simples, Bem antes de Hitchcock filmar. O mestre do suspense teve apenas o trabalho de acrescentar os quadros para que houvesse movimento. Mas em ambos os casos, é a mesma fonte, que transcende o tempo e nos desafia a novas leituras toda vez que olhamos para a criação magistral do inglês que torturava loiras e o americano que colocava seu país no deserto do real.

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