Nei Duclós
Suave perfil de mistério, me visitas sem que eu descubra
quem te desenha, longínqua.
Adivinhas meu pensamento, ela disse. Sei que é mentira,
falei. Mas acredito.
Escutas a palavra esquecida. Vives de ouvido, solista
diurno.
Espectador compulsivo, viajas num comboio absurdo, tua vida
sem nenhum sentido. Até que no corredor te aparece um anjo e te faz um pedido.
Outras pessoas já fizeram por você. Passas,
desnecessário,pelas dobras do Tempo com mãos vazias e uma idéia confusa do que
poderia ter sido.
O que vais fazer mais tarde, quando escorregares para aquele
espaço ocupado por estrelas invisíveis?
Não resista. Que me importa o frio. Quem manda deixar a
janela aberta para a minha fantasia
A pessoa olha para todos os lados e não te enxerga. Te
atiras no chão com estardalhaço. Ela ouve o barulho, mas acha que és assim
mesmo e não dá bola.
Me registras em teu álbum. Anos mais tarde, consulto. No
lugar da fotografia, tem tua marca de batom.
Tocas meu ombro com um suspiro. O céu cai súbito sobre a
trilha. Logo agora que eu estava desistindo.
Vamos nos reunir na paisagem de um livro. O que foi escrito
há tempos prevendo o futuro.
Ninguém te liga. A não ser a lembrança de alguém, perdida.
Decides escrever uma carta. Jogas no rio gelado de junho.
Nada se decifra, desista. Conviva com o desconhecido. Tu
mesmo é uma peça de martírio para a percepção de quem te ama.
O adeus te tira do convívio de uma porção do universo. Ruas,
casas, bares,parques, aniversários, pessoas somem de vista. Ficas no limbo, à
espera de um novo amor.
Lâmpadas automáticas de mercúrio em postes curvos ficam
indecisas quando amanhece nublado. Fará noite de dia? Elas piscam assombrando a
rua.
Que bonito essas ameaças femininas de não ultrapasse ao lado
de fotos lindas. É para acumular a fila do gargarejo. Doçuras.
Gastei todo o meu acervo. Preciso amar de novo.
Conexão em nuvem: os poetas já dominam essa mídia, há
tempos.