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17 de abril de 2009
ESTRONDO
Nei Duclós
Vivi demais para tanta poesia
Pude ver como foram vorazes
enquanto a maioria ficava de fora
assistindo o carro alegórico
onde os fariseus passavam a lira
de pai para filho até a exclusão
virar pó nas estantes, com versos
enredados nas mochilas devoradas
mais tarde em lodaçais executivos
Acenamos com todas as forças
para conseguir viver um pouco
a efêmera alegria de colher a flor
dos corações presos pelas palavras
Abordamos escolhos com a pena esguia
Fui áspero, mas com o tempo
desisti de cortar as víboras
Deixei-as viver por não haver saída
A não ser navegar na mesma armadilha
Mas eles farejaram a dor como cães
soltos num matadouro, que atacam
a fila ainda viva do rebanho, deixando
de lado as postas irremediáveis
Era lucrativo morder a jugular ativa
do que focinhar sentimentos sujos
espalhados como sobras do mercado
jogados na rua dos poemas mendigos
Estive perto demais do sonho. Alertei
os chacais, que fizeram do meu corpo
um fantasma. Fui prestativo
ao servir de carregador para o andor
da mediocridade a recolher as moedas
atiradas pelos carrascos que
se fantasiaram de anjos enquanto
a indiferença cobria o mundo
de porcelanas e imundície
Não era para estar aqui, ninguém previu
poetas que insistem nas tempestades
sonorizadas por ossos a inundar
a planície, a cercar montanhas
como um carrossel de cisnes
Carreguei metáforas e depositei o fardo
nas praças que viraram ruínas
Fui apedrejado ao folhear mapas
da desventura. Fomos longe demais
Agora sobrevivemos entre pergaminhos,
gritos abafados, roubos, assassínios,
vilanias de todo o tipo. Sou dessa estirpe
construída passo a passo, minuto a minuto
como se fosse nossa sina. No lugar de rasgar
o véu que cobria a terra, fizemos as pazes
com o sono, a preguiça, os dias infelizes.
Não há o que dizer quando a luta
foi um vaso partido numa briga inútil
Nove linhas, alexandrinos quebrados,
fórceps a parir miniaturas, nosso verbo
é o caos de onde sairá o abismo. Eu deveria
ter parado logo no início, mas insisti
Nunca permitiriam transcender
essa mordida primordial da anti-vida.
Dado tudo como perdido, insisto
sobre o que teria sido. Se eu soubesse
lutar poderia reencarnar um herói antigo
Talvez ainda haja o jardim proibido,
a arca dos casais, o fim do arco-íris
Talvez exista o que livraria
o canto da sua desistência, o estro
da calmaria. Talvez esse estrondo
pertença ao início, quando foi definido
o que seríamos, poetas que se estranham
quando exercemos essa arte em desuso,
a única em que Deus confia
RETORNO - 1. Imagem desta edição está neste endereço. 2. Poema em progresso: esta é a versão modificado do poema postado antes, que agora aparece quase intacto, mas diferente.
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