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13 de dezembro de 2007

A VOLTA DE “DURO DE MATAR”


O herói americano tem um perfil bem definido. Ele é um outsider, não faz parte do sistema, mesmo que ainda seja um dos seus quadros (normalmente já não é mais). É um livre-atirador, apesar das ligações que tem ou teve com os poderes da República. Sendo um independente, encontra-se no exílio, ou confinado numa cabana da montanha junto ao seu cão, ou vivendo sem mulher e filho numa pequena cidade, fora do grande circuito.

O herói não usufrui das benesses de uma vida dedicada à Causa, que é o Espírito Americano, a Essência do patriotismo, pautada pela Coragem. Por não fazer o jogo do poder e procurar resolver as coisas a seu modo, é punido com o esquecimento ou o exílio. É praticamente dado como morto até que surge a oportunidade, por acaso, de voltar ao centro do drama. É o que acontece, de novo, com Duro de Matar 4, que chegou às locadoras.

Quando ficam implicando com o pobre do Capitão Nascimento, de "Tropa de Elite", que lida com os mesmos materiais – a corrupção das corporações, a violência como solução de conflitos – chega a dar dó esse tipo de má-vontade quando vemos Bruce Willis se transformando num serial killer para evitar o caos na América (Bruce está de volta em sua grande forma de carismático ator do Mesmo que encarna, por jamais mudar, a Integridade do Indivíduo Cidadão). A defasagem do protagonista em relação ao seu entorno está na exacerbação do universo digital, quando a Vilania do Software (presente em filmes como Superman 3 e Matrix) atinge o status de terrorismo total.

John Maclane é um personagem analógico numa avalanche de chips. Mas ele não sobreviveria sem seu fiel escudeiro (que é também a reiteração do Mesmo, já que Zorro e Tonto, Batman e Robin , Tango e Cash e assim por diante, estão além da parceria masculina, formatam a relação homo como representação da identidade total entre criaturas com a mesma missão, a de salvaguardar os interesses da nação e sua cultura, suas tábuas da Lei, mesmo que para isso a Lei tenha que ser transgredida). O rapaz que o acompanha (com direito inclusive a despedida amorosa no final) é um hacker que o livra de mil obstáculos, praticamente limpa o caminho para que Mclane cumpra sua missão.

Tudo é exagero neste novo rebento da série do policial que precisa enfrentar praticamente sozinho um esquema brutal de manipulação das tecnologias de vanguarda a favor do crime. No fundo é sempre a mesma história: o sistema precisa treinar a auto-destruição para encontrar seu antídoto. No filme Shooter (também deste ano), o atirador é convocado para matar o presidente americano. Só assim poderão ser conhecidos os esquemas dos verdadeiros assassinos (era tudo uma armadilha, claro, mas esse é outro filme). É preciso simular a guerra para que evitar o pior. O cinema serve a esse propósito, além de distrair as massas dando vazão aos seus instintos predadores, pois todos sonham em demolir a Casa Branca só para se sentirem vivos.

No filme, é alguém de dentro do sistema que prepara a balbúrdia toda. O recado é claro: não há superestrutura, esquema, plano ou burocracia que dê conta. O embate é com o próprio indivíduo. A América corre risco quando alguém está para morrer, não quando um sistema entra em colapso. O que vale é a criatura em carne e osso, no caso, John Mclane, que se arrebenta e se quebra todo, sangra sem parar, mas chega lá (o doublé de Bruce Willis quebrou os pulsos e as costelas e as filmagens tiveram que ser adiadas, só terminaram em fevereiro deste ano).

É um filme de ação previsível, com o herói sendo posto à prova de mil maneiras e se saindo bem no final. As coisas que acontecem, como carros abalroando helicópteros, ou aviões a jato sendo invadidos pelo sujeito roto e esfarrapado, entre outras barbaridades, enchem os olhos de tanta besteira. Mas é um filmaço. Os americanos são imbatíveis, sabem prender a atenção com as baboseiras deles. Além do mais, temos a volta de Bruce Willis, que passou fazendo figurações em inúmeros lançamentos. Estava com a vida ganha. Deve ter ficado sem grana. Que bom.

RETORNO - Imagem de hoje: Bruce Willis em "Duro de Matar 4" - de volta ao batente.

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