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28 de dezembro de 2007

POR QUE A AUDIÊNCIA DIMINUI


A Globo perde telespectadores e há pânico diante do crescimento da rede do bispo. A segunda é clone da primeira. Não há diferença. Há menos gente vendo TV aberta, acredito, porque a idiotia cansa. A televisão brasileira tem um único assunto: ela própria. “Filma eu, mamãe, agora abraçando meus colegas. Hum, está muito bom. Vamos ver como se sente alguém, no caso, eu, ao descer essa cascata. Puxa, que sensação voar em asa delta com o instrutor coxando por trás”. Depois vem os outros temas, todos eles carregados por suas muletinhas.

Natal, compras. Depois do Natal, liquidação. Frio, São Joaquim. Calor, praia. Link no trânsito, link na Anchieta, link na ponte Rio-Niterói. Mortes nas estradas. Os motoristas são os culpados. E os programas esportivos? Foram três meses abordando a urina da atleta apanhada em doping. Aparecia a sujeita de manhã, de tarde e de noite. Com os braços de boxeador, a cara espinhada, a expressão de coitadinha. Vai ver é inocente, mas precisa destacar tanto o xixi da coisa?

E o tranco dos repórteres, aquele tom de quem está preparando a maior surpresa para os da poltrona? E os textinhos criativos, as materinhas humanas, os breques significativos nas frases lapidares, as implantações de palavras na boca dos entrevistados, que repetem sem parar o que os repórteres sopram? Aí, de manhã tem novela, no início da tarde tem novela, de tarde tem novela, no início da noite tem novela, no meio da noite tem novela e no fim da noite tem novela. Na madrugada, vem algum filme de porrada. Na sessão da tarde, adolescentes americanos que se formam na High School vomitam, cagam, chupam e metem pipoca no pingolim ao som da dublagem asquerosa e guinchante.

Tem também os programas de humor. Todos fazem papel de gay ou puta. Puxa, que engraçado, olha a faca! Aí o peludo na sauna diz que não é gay, isso umas trezentas mil vezes. De manhã, a apresentadora tem uma risada forçada assim ka ka ka ka. Depois vem os desenhos da Xuxa, que sempre acaba o programa fazendo carinha de vaquinha de presépio, dando algum recado, enquanto vende um monte de porcarias para as crianças nos intervalos.

Uma rede dedica seu horário nobre para veicular um programa religioso horrível, que fica horas no ar. Em qualquer zapeada, tem gente rebolando e se esganiçando. O sertanojo tecno domina as paradas. De vez em quando tem um pagode, aquela música que é sempre a mesma. Uns pelotudos, ao lado de umas rebolantes, cantam: “Malandro malandro malando malandro”. E guincham: diz! Ah, nunca esquecem de pedir passagem para o samba. Já deu para a bola esse troço do samba pedir passagem. Vão cagar pedra.

Nas novelas ninguém presta. Os bonzinhos se corrompem, os maus se locupletam, os veios comem anjinhos, as veias se esfregam nos garotões, o sovaco impera, a celulite grassa, os chupões tomam conta do cenário. Não há perigo de melhorar. Não se contesta nada, ninguém debate uma idéia e aos domingos o gordo sinistro e gritalhão, que está há décadas no ar, debocha da cidadania fazendo todo mundo escorregar na maionese. Tem poder o sujeito. Num domingo desses ele xingou a pressão que faziam para largar o osso e deixar que o presidente inaugurasse a televisão digital.

Eles tem poder porque ninguém diz nada. Abandonar a televisão é o sinal mais explícito dessa revolta surda, frustrada, da população sob a mais intensa ditadura. Por isso a TV perde audiência. Não é porque isso ou aquilo. É porque são uns imbecis medíocres que tomam conta de todo o espaço disponível para veicular suas cagadas. Nenhum programa que preste. Ninguém com cabeça sendo entrevistado. Viva os cem anos do empreiteiro do concreto, recentemente denunciado em matéria do New York Times. É impossível a vida resistir no chão estéril dos acordos público-privado do imortal arquiteto. Aquele que se diz comunista. Quá quá quá. Comunista era o Trotski. Levou uma picaretaça no crânio. Não ficou fazendo formas redondas para ficar milionário.

RETORNO - Imagem de hoje: cena do filme "O assassinato de Trotsky". Trotsky, interpretado por Richard Burton (sentado) ao lado do seu assassino, um assustador Alain Delon.

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