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27 de maio de 2006
TRUMAN REVISITADO
Sabe aquela vibração dos telespectadores quando Truman encontra a saída da sua jaula de luxo e se salva? Más notícias: era tudo representação. Truman não existe. Quem está lá é um ator, Jim Carrey. Sabe o desencanto de Christof, o criador e diretor do show, que tenta manter seu personagem prisioneiro? É tudo mentira. Trata-se de Ed Harris, que finge estar decepcionado. A parábola da libertação da sociedade do espetáculo (expressão usada aqui para fazer justiça a Guy Debord e sua obra imortal de denúncia, publicada nos anos 60), ao contrário das narrativas anti-alienantes, é apenas a confirmação do que o próprio filme denuncia. É a cobra mordendo o rabo. Não há escapatória. Você se mantém no cárcere de Truman, com a diferença de que você não é o astro, nem sequer o coadjuvante, você é o espectador imobilizado. Você é enganado pelos atores que fingem ser você, pelo diretor Peter Weir e sua brilhante obra, pelo comediante que convence ser dramático, exatamente porque esta comédia, a vida sob o tacão da representação, é a tragédia a que nos acostumamos a viver e só saímos quando o diretor manda, e não conseguimos chegar ao outro lado da porta, como Truman, que some no escuro da saída para que o filme acabe.
BUTIM - A esperança se acendeu quando Simon acenou com a possibilidade de ser candidato a presidente? Última forma. A ditadura veio para ficar. As pesquisas encomendadas são festejadas no Planalto. Nem precisa eleição, a mesma ratatuia irá dividir o butim. Por isso encerro minhas atividades de espectador da TV aberta e me concentro nos filmes que vejo em série, para compensar o tempo que perdi vendo noticiário comprado na TV, em que os apresentadores, sem mover uma linha do rosto, se inclinam um pouco para a frente a fim de impressionar quando mentem. Vejam aquele repórter tão bem plantado num departamento público, a desovar alguma denúncia e a assumir esse papel de isenção civilizada no país em ruínas. Aturem os animadores de auditório, a celebrar sempre os mesmos cantores, que berram nossa desesperança, enquanto cada milímetro do espaço da cidadania é tomado pela publicidade. Escutem a algaravia politicamente correta de ecologistas e todos os defensores das minorias, além das lágrimas de crocodilo sobre as vítimas. Vejam quanto incêndio, tornado, enchente para encher de conforto suas noites, em que você é um Truman feliz, e tão bem resolvido que pode a toda hora achar que se liberta por meio de um bom espetáculo.
FÉ - Relaxe, a Copa vem aí. Junto, aquela arenga anti-patriótica de que o futebol ajuda a alienar o povo. Torça com vontade, faz de conta que é turista em plena Alemanha, a envergar o verde amarelo tão caro a todos nós, que somos italianos, japoneses, alemães, portugueses, baianos, gaúchos, mineiros ou nordestinos. E que só somos brasileiros quando alguma grande vitória se aproxima. Vi a mini-biografia de cada craque da seleção. Tudo obra de ventre de mulher, para usar a imagem de João Cabral. De mãe viúva, de vida difícil, de cabelo enrugadinho, de dente para frente, de pernas franzinas. Tudo filho do país que entregou seus filhos para serem criados por outras nações. Hoje eles são espanhóis ou italianos, possuem o que chamam de dupla nacionalidade. Juraram bandeira alheia, falam com sotaque. Mas continuam os mesmos, de chute forte, de graça e mágica nos pés. Eles nos trazem um pouco de fé no mundo em queda. O problema é agüentar o monopólio da mesmice nas matérias, nas transmissões, que possuem aquela intimidade comercial com os ídolos.
CÃES - Crie seu próprio show. Como cansam de dizer, você merece. Seja o astro. Diga algo engraçado antes de encontrar a saída. E parta para uma vida plena, no outro lado da redoma, onde te esperam os cães ferozes da aldeia, ou os preparados donos do poder, os que se revezam há décadas e aqui ficarão até te verem ir desta para a melhor. Mas uma coisa é certa: a articulação mimosa dos lábios do Alckmin, ou a voz insuportável do presidente ágrafo, não quero nem ouvir.
RETORNO - 1. A imagem de hoje é do filme "O show de Truman": Jim Carrey procurando a saída. 2. Caí no conto do vigário (tanto é que decretei última forma no post acima): o JB anunciou e o blog do Noblat repercutiu a desistência (desmentida pelo próprio senador) de Pedro Simon à presidência. Noblat, além da barriga que deu, ainda foi arrogante, invocando a profecia do seu blog em relação à chance nenhuma de Simon. Que me sirva de lição: todos perderam a credibilidade. De agora em diante, só confio no Diário da Fonte. Parafraseando Oscar Wilde: "Vou levar meu diário na viagem; pelo menos terei algo para ler".
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