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28 de maio de 2006
MÍDIA E MANIPULAÇÃO
A ditadura não dá mostras de perder a força porque se instalou na cabeça das pessoas. Vejo isso entre os jornalistas. Há um pacto de elegância entre os que ocupam cargos de confiança. Há alguns temas tabus e uma visão arrogante do seu entorno, formado por aquelas criaturas que envelhecem sem ter importância nenhuma e acabam se retirando para lugares isolados, onde o vento sopra nas dunas. Os chefetes, equivalentes a feitores que gozam de boa saúde junto à direção, dividem a mesma roupa e restaurante e fazem rodízio entre os veículos poderosos. Gostam de usar expressões como "Lula está convencido", pois isso dá um certo ar blasé aos textos não comprometidos, a não ser com a continuidade do arbítrio. No fundo, se cagam de medo de dar uma bola fora, por isso elegeram a prudência bem fornida para se perpetuarem no poderzinho das redações, que nada mais é do que uma clonagem do poder maior, o financeiro. Conheço essa raça de víboras. São capazes de dar credibilidade a uma calúnia, a de que Pedro Simon desistiu da candidatura, e quando pegos em flagrante fazem tardiamente uma reparação, sempre dentro das suas veleidades aristocráticas.
OSTRACISMO - Quando cheguei nas redações gigantescas de São Paulo, nos anos 70, a ditadura já tinha feito grande estrago entre os jornalistas. Eles usavam camisas quadriculadas bufantes, olhavam para o infinito e se manifestavam de maneira chula, pois isso dava status de poder. Falavam que isso não falava ao pau (com perdão da expressão ) ou que dois repórteres deveriam produzir o texto a quatro patas. Os subalternos não escreviam matérias, perpetravam. Já estavam colocando no ostracismo os talentos que acreditavam ser a imprensa um foco de resistência. Os resistentes se refugiavam na imprensa alternativa, onde em alguns casos reproduziam vícios adquiridos nos jornalões e revistonas. Poucos sobraram com dignidade e o resto acumulou esqueleto no armário. Você não confronta um poder armado, você, serzinho inerme, que vive dessa coisa escrava que é batucar pretinhas. Então você se cala ou se convence que esse é o mundo possível e vira um jornalista político que consegue passar alguns recados por meio de um pacto de normalidade com a violência institucionalizada.
CHICOTINHO - Primeiro, a censura se disseminou em rede por toda a sociedade, depois penetrou as pessoas, impregnou o coração e colocou uma capa protetora na cabeça. Foi assim que chegamos à atual manipulação da mídia. É de ver o pânico que se instala quando alguém destoa desse consenso. Os 12 milhões de votos de Garotinho em 2002 assustam a direita, por isso colocaram um sujeito evangélico com cara de diabo na capa da Veja. Qual o grande paradigma de honestidade anti-populista do Brasil, segundo a revista? Juscelino Kubistchek!, um cara que nem fez seu sucessor porque seu governo foi pautado pela gastança, a inflação galopante e o narcisismo predatório. Quem venceu as eleições foi Jânio Quadros, que tinha como plataforma a limpeza da bandalheira política, o que acabou em golpe de estado e eterna ditadura. Esse é o modelo de quem estocou mortalmente o pré-candidato. Sujeitos que fazem uma capa desse naipe são do tipo que descrevi. E pior é que se acham modernos, isentos, interessantes. São capazes de visitar a redação no plantão de domingo batendo um chicotinho nas botas de montaria, como acontecia com certo diretor de redação que acabou fuzilando a namorada pelas costas.
ESTOCADA - Por que eles continuam dando as cartas? Porque você, amigo jornalista, permite. Você se borra nas calças diante desses merdas. Então vou te ensinar, como na cena de Quase dois irmãos em que Flávio Bauraqui fez Caco Ciocler xingar a mulher traidora. Diga para ele: "Seu filho da puta, seu bundão, seu cagalhão caga pau do poder. Isso eu não vou fazer, seu porra. Isso não me fala ao pau. E fica quieto senão te ponho quatro patas na tua cara". É assim que se faz.É assim que se derruba a ditadura.
RETORNO - Imagem de hoje: Crumb e o blues - talento e liberdade.
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