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24 de setembro de 2005

CARGA MUITO PESADA



A nova série de episódios de Carga Pesada, o seriado da Globo, bate numa tecla única: a de que os protagonistas, Pedro e Bino, são arautos do politicamente correto, uma espécie de iluminação para os problemas nacionais. É de chorar ver Pedro da Boléia, interpretado por Antonio Fagundes, fazendo discurso para policial corrupto e tentando encaminhá-lo para o Bem. Ou ver Bino, interpretado por Stenio Garcia, envolver-se com as maiores trapalhadas geradas por suas boas intenções. Um recado recorrente é que se trata de dois personagens que não encontram pouso fixo (apenas provisório) em mulheres, mas na convivência mútua. Surja a musa que surgir, eles sempre acabam juntos e aparentemente solteiros, celebrando o fato de serem inseparáveis.

LATA - No episódio de ontem, escrito por Ercila Pedroso, que adaptava novelas mexicanas no SBT antes de ser contratada pela Globo, e que tem um currículo extenso de contribuições ao teatro e à dramaturgia televisiva, os dois companheiros são assaltados por marginais que fazem distribuição da carga para a comunidade favelada. O que se salva é a aparição, infelizmente meteórica, de Othon Bastos. Só o close em seu rosto dizendo: foi só um aviso!, depois de um tiroteio, vale por mil horas de Carga Pesada. Qual o recado do programa ontem? Você precisa apoiar a garotada da favela, incentivá-la a bater lata, que assim a população poderá peitar os bandidos armados. Uma mensagem recorrente de Pedro é que pela lei e a coragem pessoal é possível reverter a situação de violência e corrupção do país. Seria perfeito se a televisão não participasse do sistema de exclusão, por meio do noticiário e da grade de programação. Dizer que tudo repousa nos ombros da iniciativa dos indivíduos é achar que se pode aconselhar essa criatura denominada o brasileiro (que sempre são os outros, e que sempre é lembrada como respknsável por todas os nossos problemas) a tomar uma atitude. Não há atitude sem políticas públicas. O cidadão não existe sem o governo. Como vivemos numa ditadura corporativa, os recados bonzinhos acabam reforçando os equívocos. Pessoas soltas ao deus dará não se salvarão só porque Pedro aconselha o marido a voltar para a família. Ou substitui o fujão que deixou as crianças pobres na mão.

ESCRAVOS - Onde há grana, há quadrilhas. Agora foi a vez dos árbitros. Assistimos a jogos monótonos, acertados previamente, segundo denúncia da Veja, com pernas de pau que sobraram da grande sangria de talentos da atual fase do futebol brasileiro. Alguns craques solitários não podem fazer a festa das torcidas. Acabamos todos torcedores do Barcelona ou do Real Madrid, em campeonatos que recebem cobertura completa da mídia, enquanto ficamos ermos de jogos importantes. O esquema de monopólio das transmissões, que gera brigas judiciais como a da Band para ter direito a filmar os jogos e assim abastecer de imagens seus programas esportivos, é típica desta situação em que a seleção brasileira é propriedade de uma só rede e um só patrocinador. País sem soberania é assim: vive como escravo. E ainda tem que aturar os conselhos da Carga Pesada.

RETORNO - Os pitacos de Arnaldo Jabor, o diretor da humanidade, tem extrapolado todos os limites. Ontem ele falou do real como moeda forte, observando cinicamente que o PT caiu agora na real (um trocadalho e tanto). Não temos moeda, temos papel pintado graças à política econômica de arrocho a que somos submetidos e que suga a população de recursos para sobreviver. A falsa moeda é uma espécie de passaporte para a pirataria internacional fazer a festa. Um popular (o brasileiro!) observou o seguinte: "De que vale moeda forte se ela não está no meu bolso?" Teremos moeda forte quando zerarmos as dívidas externa e interna e quando a política econômica estiver voltada para as necessidades da população. Servir de canteiro para a fome alheia (o celeiro do mundo!), exportar proteína, e pagar um trilhão de dólares em onze anos só de juros para os grandes bancos não fazem da nossa moeda algo que preste. É como disse uma autoridade financeira americana sobre as falcatruas que nos assombram: "A coisa toda fede".

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