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28 de abril de 2004

A PRINCESA PEDE SOCORRO


Quando todos os telespectadores, exaustos de tanto procurar algo que preste, desistem e vão dormir, os cruéis programadores colocam no ar, no fundo da madruga, algo como The Biographer: The Secret Life of Princess Diana, que é um filme da TV americana sobre o ofício do escritor e não apenas mais uma baboseira sobre a família real. O drama, lançado em 2002, gira em torno da relação entre o biógrafo Andrew Morton e a prisioneira que em vão tentou escapar da armadilha.

A VERDADE – É um filme que trata da vida dentro de uma editora, o que me toca muito de perto. O editor envia seu talento para Los Angeles para fazer uma biografia de Marilyn Monroe. Mas a princesa Diana convoca Morton secretamente para contar tudo o que está sofrendo no casamento e isso provoca incredulidade do editor, ou, como é moda agora, o publisher Michael O'Mara (interpretado magistralmente por Brian Cox).

A estratégia da confecção do livro é o forte do filme. Para despistar o temível serviço secreto britânico (que se reúne em clubes masculinos de Londres, hábito que deu má fama aos ingleses) tudo foi feito escondido, inclusive da própria mulher de Morton. Este, conta com um intermediário, que lhe fornece as fitas gravadas pela própria princesa. A primeira versão foi totalmente destruída pela biografada, o que provocou a ruptura provisória do escritor com seu editor. E que também desencadeou o principal: obrigou o biógrafo a ir mais fundo, a procurar mais dados, a buscar mais aliados.

Esse trabalho da segunda versão, de convencimento das pessoas que estavam em volta da princesa, de embates com o editor, de desespero no trabalho oculto, confinado, é a prova dos nove do escritor, testado na seriedade do seu ofício, pressionado pelas emergências da sua época, jogado na rua do próprio destino, diante do perigo que corria junto com a família, o risco de perder tudo, casa, carreira, vida. Chamam esse tipo de filme de docu-drama, o que considero um palavrão. Prefiro chamá-lo de um belo filme sobre um assunto muito pouco enfocado. Escrever profissionalmente é um trabalho de cão. Todos usufruem do resultado, mas pouco sabem do que realmente se trata.

A PROFECIA - O filme é também um relato de como funciona a indústria cultural. A estratégia da impressão, distribuição e venda do livro enfrentou não só o esquema da coroa, mas a confortável posição de livreiros e editores, todos satisfeitos com os livrinhos anódinos sobre a realeza. Do outro lado do balcão, os ferozes tablóides, que acabaram consolidando a desgraça da princesa, num acidente muito mal explicado, exatamente cinco anos depois, como ela mesmo previra: “Não sei o que será de mim daqui a cinco anos”, dizia, profética.

Segundo o filme, Diana foi usada como reprodutora e depois jogada fora. Não está explícito, mas, como se rebelou, sumiu do mapa.O importante é que o conteúdo do livro jamais foi desmentido. Foi considerado bizarro e mentiroso quando lançado, confundido com matérias de jornalismo marrom. Mas era tudo verdade.

Quem poderia apostar nisso? O diferencial foi o escritor ter assumido o risco, mergulhado no trabalho, aceito as injunções a que foi submetido, para sair-se com uma obra que vendeu cinco milhões de exemplares e demoliu a imagem da família real. Charles, o cruel, nunca mais foi visto da mesma maneira. Uma maldição caiu sobre ele. Corre o risco de jamais ser rei. Poderia ser uma pessoa melhor, se tivesse a coragem de casar com sua paixão em vez de submeter-se ao ex-império fanhoso e prepotente, que procura perpetuar-se como um navio fantasma num mar de tempestade permanente.

RETORNO - Jorge Freitas derruba-me com seus elogios aos textos aqui, Gim Tones emociona-se coma despedida de um personagem de Universo Baldio, Fernando Pereira da Silva e meus irmãos me convidam para ir a Uruguaiana num encontro de ex-alunos maristas, Marco Celso Viola me envia seu livro seminal de poemas definitivos, confirmando ser ele o grande poeta oculto que o Brasil precisa, ganho novos leitores fixos como Márcia Hatomi, Paulo Paiva e Zé Medeiros. Tudo isso me faz a cabeça e o coração.

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