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28 de junho de 2020

INGENUIDADE E CULPA EM VICTORIA E ABDUL


Nei Duclós

O filme de Stephen Frears, na Netflix, apresenta os dois protagonistas por  meio de gestos. O muçulmano indiano Abdul (Ali Fazal) caminha apressado em passos curtos a revelar sua ingenuidade no meio da multidão, onde é chamado de imbecil quando tropeça num militar inglês. Seu trabalho é registrar prisioneiros num grande livro, o que demonstra que trabalha para a lei na Índia ocupada, portanto é inocente.

A rainha Victoria (Judi Dench) é apresentada como uma inválida manipulada pelas servas e que come apressada no banquete preparado pela Corte. É dona de um império que domina 1 bilhão de pessoas. É, portanto, culpada.

Mas ela é a lei e escolhe Abdul para seu confidente e professor. Os papéis então se invertem. Ela nada sabe sobre a Índia que seu  exército e marinha dominam e resolve aprender a cultura que desconhece com o solicito escrivão. Nessa situação ela é ingênua pois acredita em tudo o que o bonitão diz, para escândalo da Corte, que vê a ascensão social do penetra.

Abdul aproveita seus conhecimentos que são novidades para a rainha e mente sobre sua familia, sua profissão e a História do seu país.  É, portanto, culpado.

O flagrante causa impacto mas não quebra o vínculo.  O que os une é a diferença.  Cada um vê no outro a oportunidade de sair de suas prisões. Um da miséria e a outra do tédio.  Funciona até a morte da rainha, que se fina nos braços do seu sábio confidente. Ambos foram ingênuos e culpados, cada um a seu tempo, mas jamais inocentes. O humano amor que medra na diferença eleva-os, apesar da injustiça imperial, da fatuidade cortesã, da violência da exclusão, do desperdício e do deboche.

 filme não é ingênuo,  culpado ou inocente. E apenas cinema, essa arte confinada em si mesma.



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