Nei Duclós
É da natureza
do seu trabalho o fato de Tim Robbins não parecer o que realmente é: um dos
poucos atores de primeiríssimo time do cinema. Sua cara limpa, sua altura
desmedida em relação aos seus interlocutores, o disfarce nos papeis em que
parece ser um assessor de boa vontade do chefe da prisão e é um fugitivo
trambiqueiro(Um sonho de liberdade), parece ser um cara favorável à Sérima Arte
e é seu algoz (O Jogador), tudo deságua nessa figura que se anula diante das
câmaras, pois nada tem de atrativo tradicional. Seria apenas um bom moço de
comédias românticas, não fosse sua linhagem, filho de mãe atriz e pai cantor e
no início de carreira um jovem ator de vanguarda teatral.
Ele seduz o
olhar do espectador para o que existe fora dele, o ator, como se nada tivesse a
ver com os papéis sinistros que encarna. Não que não saiba fugir dessa imagem
de falso bom moço, já que em Guerra dos Mundos Spielberg o transformou num
americano em pânico armado contra os alienígenas. Ele pode fazer qualquer
coisa, como é o caso do velho motorista maluco de Ongs no filme Um dia
perfeito, de 2015, sobre o fim da guerra em Sarajevo, em que toma conta do
filme fingindo não ser ninguém, e é apenas tudo.
É que sua
preferência é anular-se até o osso aparentando o que não é, para que possamos
enxergar o essencial: o próprio cinema. Porque a Sétima Arte não são os atores,
nem o roteiro, nem os bastidores, o making of, o marketing, as tramas e a ação,
como prova Orson Welles no seu póstumo O Outro Lado do Vento (disponível na
Netflix). Um filme é apenas o cinema, em que todas as artes que confluem nele
são coadjuvantes para que se apresente nas nossa fuças viciadas em comentários
tipo “mas que fotografia!” e nos faça enxergar o óbvio.
Todo filme é
sobre cinema e Tim Robbins é um dos seus supremos demiurgos. Atrai nossa
percepção para que realmente conta, a arte imperceptível e anônima que teimamos
em não ver em favor de ilusões e platitudes. Orson Welles apresenta um filme
dentro do filme, e esse filme é uma alternativa ao seu clássico O Processo, que
filmou nos anos 60 com Anthony Perkins fugindo desesperado de uma perseguição
judicial e caindo nas garras da curiosidade das crianças. Neste O Outro lado do
vento, é um casal nu que se defronta com a presença invisível do diretor
(interpretado pelo maleva John Huston) que esnoba scripts, revela o talento de
atores sem nenhuma expressão comercial e conta como um filme é impossível de
ser realizado numa indústria que exige resultados financeiros e não arte.
Tim Robbins
é o cara que não nasceu talhado para ser o ator principal nem coadjuvante, mas
sim para ser espectador. Só que ele subverte esse destino e se funde no cinema,
que é sua missão realizada com esmerada parcimônia. Ele é um dos monstros, o
tipo de ator que encarna o personagem sem carregá-lo nas costas, como fazem os
cavaleiros. Só que ao se transformar, se funde e aparentemente se anula.
Ficamos com a melhor parte: seu talento de infinita capacidade de realização.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirNossa, como ele é mal
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