Nei Duclós
Parece simples dizer o que fica. Mas é duro desistir de ser
difícil.
Às vezes a palavra tarda.Ela espicha o fôlego no mergulho
antes de vir à tona.Por isso esse verso que parece suspiro, mas no fundo é um
urro
O tempo enterra tudo para extinguir o que é vivo. Mas é
traído pelas sementes.
Se tens um projeto, realize. Nada tens a perder senão o medo
Viver é uma arte que guardamos no sótão para evitar a
avaliação do mercado
Cuidei da minha biografia: noites em claro, cidades remotas,
trilhas perdidas, abismos. E a observação de pássaros competindo com o mar.
O ano está passando a ferro e fogo o lençol amassado de
lembranças. Somos daquele tempo em que viver tinha prioridade.
Não perco tempo. Em cada respiração, escrevo. Não a caneta
ou teclado, mas com o espanto, esse recurso desperdiçado pelo sofrimento.
Não sei mais o que dizer. Perdi a embocadura do ser. Mas vou
sair atirando no estouro dos cavalos selvagens. Dispense mais tempo à leitura.
Cate letrinhas
Não se aproprie de todas as virtudes deixando as sobras - os
crimes - para os outros. Divida para que a solidão não assuma o poder.
O rio subterrâneo da criação flui o tempo todo. De vez em
quando mergulhamos para trazer à tona o poema ainda se debatendo.
Minhas palavras não nascem para ocupar teus nichos. São
pássaros selvagens sobre paisagens tímidas
O mito precisa ter cuidado de não fazer besteira antes de
desaparecer. Para não ser lembrado só pelos seus erros.
O vidro imobilizou as folhas que se debatem numa neblina
surda
Nosso cenário é limitado: rosto e pés. E as paisagens que
colecionamos nas viagens quando pedimos que alguém bata fotos do nosso sorriso
na porta dos templos.
Isso é tudo por ontem
RETORNO - Imagem desta edição: Karen Tarlton
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