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22 de novembro de 2015

RAÍZES DO CONHECIMENTO



Uma das lutas de Miguel Lobato Duclós (1978-2015) é contra a indiferença. Estamos acostumados a conceitos como filosofia ou filósofo, mas não nos perguntamos de onde surgiu tudo isso. Miguel quis saber e encontrou nos pensadores fundamentais um debate sobre as origens do pensamento, a passagem da percepção assombrada para o encadeamento lógico, para a produção racional. Esse é um tema que poderia ser encarado com indiferença, pois quem se importa, já que o que está posto assim fica.

Mas Miguel chama para o debate e faz algumas citações decisivas sobre algo que ocupou a mente dos fundadores desse templo cultural que é a linguagem voltada para decifrar os mais íntimos e ancestrais momentos da humanidade que se distancia das suas raízes anteriores à filosofia. Vale a pena arriscar-se nesse pequeno , mas agitado mar de palavras, postado em abril de 2010. O filósofo nos convida para a aventura. Todos a bordo? Não é fácil, mas pode ser prazeroso e ter esse clima tranquilo do estudioso que na cadeira, caminhando ou no chão lia o que era necessário para entender melhor o mundo em que vivemos.

PASSAGEM DO ASSOMBRO PARA A FILOSOFIA

MIGUEL DUCLÓS

http://blog.cybershark.net/…/passagem-do-assombro-para-a-f…/

Na Metafísica de Aristóteles, livro I capítulo 2, 982b e seguintes, está a célebre afirmação, que na tradução dos Pensadores (Cocco), ficou assim: “Foi, com efeito, pela admiração que os homens, assim hoje como no começo, foram levados a filosofar, sendo primeiramente abalados pelas dificuldades mais óbvias e progredindo em seguida pouco a pouco até resolverem problemas maiores”.

No texto citado, a nota 15, de Joaquim de Carvalho, já nos dá a pista do uso da palavra thaumazein em Platão, no Teeteto, de que “a admiração é o princípio da filosofia”.

O trecho diz o seguinte:

“Sócrates — Estou vendo, amigo, que Teodoro não ajuizou erradamente tua natureza, pois a admiração é a verdadeira característica do filósofo. Não tem outra origem a filosofia. Ao que parece, não foi mau genealogista quem disse que Íris era filha de Taumante. Porém já começaste a perceber a relação entre tudo isso e a proposição que atribuímos a Protágoras? Ou não?”

Pesquisando na web achei esse texto, muito interessante, sobre o contexto específico do uso da palavra nos dois trechos.
http://www.apaclassics.org/AnnualMe…/…/abstracts/ranner.html

Muito bem. A questão que surge é se esse thaumazein pode ser aproximado ao famoso efeito-tremelga de Sócrates em seus interlocutores, na irônica fala de Mênon em diálogo homônimo. Na tradução inglesa de Jowett, a fala de Mênon ficou assim

“MENO: O Socrates, I used to be told, before I knew you, that you were always doubting yourself and making others doubt; and now you are casting your spells over me, and I am simply getting bewitched and enchanted, and am at my wits’ end. And if I may venture to make a jest upon you, you seem to me both in your appearance and in your power over others to be very like the flat torpedo fish, who torpifies those who come near him and touch him, as you have now torpified me, I think. For my soul and my tongue are really torpid, and I do not know how to answer you; and though I have been delivered of an infinite variety of speeches about virtue before now, and to many persons–and very good ones they were, as I thought–at this moment I cannot even say what virtue is. And I think that you are very wise in not voyaging and going away from home, for if you did in other places as you do in Athens, you would be cast into prison as a magician”

A tal tremelga em grego chama-se NARKO, uma palavra que vai ser usada na farmacologia, dando origem ao português narcótico. Então, a princípio, a ação socrática parece se aproximar mais de um entorpercimento que gera paralisia do que de uma admiração. Seria a admiração (em inglês wonder) também uma forma de paralisia?

Esse é um dos pontos chaves de todos os diálogos aporéticos, onde os interlocutores de Sócrates serão obrigados a admitir que não sabem precisar um conceito que julgavam estar muito bem definido. Notadamente, falando-se da virtude, no próprio Mênon, se ela pode ser ensinada ou no Laques, o diálogo com o general sobre a coragem. Lembrando também do percurso descrito na Apologia cujo primeiro passo para o conhecimento é o admitir da própria ignorância.

Essa é uma da série “Grandes posts que ninguém deu a mínima pelota”. Se quiser debater está lá no Fórum Consciência: http://www.consciencia.org/forum/index.php?topic=1146.0

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