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28 de maio de 2015

PROVA



Nei Duclós

Começa de novo ou continua?
A vida é uma só ou tenho muitas?
A resposta estaria na pergunta?
Passei na prova ou na consulta?

Retomo a perda em luz tardia
em vez de insistir, eu reinicio
volto mudo ao alvo na parede
onde a indiferença me fuzila

Não importa a obra, mas a fuça
que roço em péssimo alvoroço
ninguém me flagra em fogo morto

Busco o incêndio que não suja
brando despertar de jogo brusco
contradigo a dor, faço de conta


27 de maio de 2015

OS ESPÍRITOS MORAM CONOSCO



Nei Duclós

Os espíritos moram conosco
Sentam à mesa para o café
passam como brisa pela sala
curtem uma janela aberta
passeiam no quintal
ficam horas nos cantos
e até mesmo deitam nas camas

Não são almas afins, de gente
próxima que se foi e fica rondando
São migrantes que acham um pouso
vieram não se sabe de onde
e não incomodam porque não são vistos

Já tentaram entrar em contato
mas não gostam de mesa branca
nem de médiuns de olho revirado
preferem se misturar às flores
enquanto não são chamados
pelas ordens do além

Se debruçam em teu ombro
quando fazes um poema
entram em pânico se te enfureces
e pegam carona nos passeios
Suas imagens então aparecem
nos vidros do carro, quase nítidas,
como se fossem adesivos

Mas são apenas espíritos
Já tiveram uma vida e a agora
exercem suas presenças no limbo
Gostam de orações porque a luz
das velas e das palavras
de alguma forma os acalmam

Vai ver eu é que sou a verdadeira
assombração e trafego imune
por esses corredores procurando
sabe-se lá o que. Talvez o anjo
que enfim me diga: estás pronto
para a casa definitiva junto a Deus

Então farei as malas de areia
e irei para a paisagem perene
onde medram cores raras
e talvez te encontre lá
amor que jamais tive
Toda enfeitada para nossas
núpcias na longa eternidade



26 de maio de 2015

TEU OLHAR COMPREENDE



Nei Duclós

É um filme que estou fazendo. Sem nada, só com a luz. Teu olhar compreende.

Não dava nada por esse dia. Mas alguém pôs fogo nele. E riu, a danada. Por que tanto encanto?

Tanto te falei que gastei o acervo. Passei para uma fase melhor, o silêncio

Venha me ver, anule a distância me costurando à tua pele

Você sabia que inteirinha cabes no meu abraço? Me tira um pedaço, flor do desperdício.

Nenhuma provocação me tira do rumo: cercar-te de tudo o que sinto sem ruído.

Caprichei na letra para abafar a concorrência. Sei que admiras a elegância

Só de vez em quando te envio uma mensagem. Quando o amor é vasto lota as válvulas de escape.

Não temos segredos. Tudo está claro na gruta do desejo.

Você me segura com o olhar. De pedra passo a criatura . Viração de musgo
em vento solar

Respire, fôlego curto. Exercite seu susto, doçura

Não te livras de mim depois de dar bandeira. Faça assim: diga que estás lá na esquina.

Não posso dizer direto em teu rosto, encoberto por pensamentos à mercê do dia. Digo então por bilhetes que se desmancham. Chamam de poesia, mas é dor provocada pela esperança.


RETORNO - Imagem desta edição: Julie Christie.

25 de maio de 2015

ESTRANHOS




Nei Duclós

A poesia cansa
assim como as confidências
É preferível a dança
glorioso grude de estranhos


PRÓXIMA DEMAIS

Nei Duclós

Próxima demais, acabo te esquecendo.
Lembro só quem está distante.
Meu olhar viciado em paisagens
não captura o primeiro plano.

Teu rosto é estranho,
não apareces no espelho.
Quando pedem a outra face,
te peço socorro.