Nei Duclós
Tudo é o mar e o resto é o meu
coração avistando terra.
Tudo é sal e o resto é o amor
pedindo água.
Amor é linguagem cifrada. Fora do
sentimento, não significa nada.
Não bastou a atração de corpos. Deus
pôs o amor para não haver dúvidas.
Não durma tanto. Terás tempo quando
chegar a eternidade.
Não te deixei pensar muito. Voltei à
carga logo em seguida para que tua falta de ar não fosse substituída.
Errei de propósito. Te acertei por
acaso, meu álibi perfeito.
Voltaste ao sumidouro, flor do
abandono. O que faço com as flores, reféns de um domingo morno?
À noite a Minguante fez frila de
lâmpada mercúrio. Era a luz mais caprichada na rua. Com a grana foi passear de
dia. Usa túnica transparente.
Encaixa porque o coração está
embutido.
A tarde passou em branco. Como tu,
ausente.
A bela camponesa serviu o fiambre no
meio da nossa faina de carpir um lote. Só aí começamos a suar.
Poesia é falta do que fazer. Melhor
lavar uma louça. Desde que eu possa prensar aquele corpo contra a pia
Não dedicamos todo o tempo ao amor
que nos consome. Deixamos claros ao longo do dia. É quando procuramos telefonar
fora da área para quem não pode atender, mas é culpada.
Inventamos a relação onde não havia
nada. Um torrão de açúcar no amargo das horas. Uma pele que arrepia à toa. Um
olhar por cima do ombro para ver os predadores.
Quando transborda, o amor silencia.
Fica idêntico ao tempo de solidão. Como saber a differença entre a paixão em
excesso e a longa espera?
Temos medo que o sentimento faça as
malas. Por isso estamos sempre de tocaia, revirando gavetas para ver se existe
algum bilhete de viagem. É pânico precoce de jardim abandonado
Te beijo para te lembrar de um
compromisso: me dar uma chance, nem que seja por um segundo.
O esplendor da manhã é a alegria da
criação. Pegamos carona nesse gesto que inventou a claridade.
Todos esses sonhos que não se
realizam levaremos como bagagem na
última viagem.
Deles se servirão os anjos, mendigos do cosmo
Deles se servirão os anjos, mendigos do cosmo
Estavas brincando quando quiseste o
poema.Ficaste séria na hora do verso. Choraste quando ele se despediu arrancando
as flores.