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28 de setembro de 2012

DIZER O QUE NÃO DIGO



Nei Duclós

Sem querer te guardas para o dia em que eu pousar no teu ouvido, dizendo o que não digo, projetando na tua tela a louca fantasia.

Quero que venhas sempre até eu criar coragem de te dizer o que imagino.

Talvez me queiras e isso acaba comigo pelo tempo perdido.


Não precisa dizer, basta que eu diga. A ti cabe o gesto de querer abrigo.

És apaixonada pela onda. Quero ser a volta da espuma quando te leva junto.

Passaste bem rapidinha. Volta, diminutiva

Escapas, lisinha, com tua presença que sonho um dia ser minha


Quero que venhas sempre até eu criar coragem de te dizer o que imagino.

Não precisa muito. Só dizer a palavra sublime, a que te deixa no ar, sem fôlego.

O passeio que não fizemos quando podíamos agora é lembrança que invento enquanto te atraio com versos, café e passarinhos.

Toda vez que vens pertinha lembro o quanto te vi tão linda pelo tempo afora, andorinha.



 SINGULAR PLURAL

Amor fechado, botão de rosa, ou que se abre, plural, festa de pétala: qual sua verdadeira natureza?

Soltei os pássaros e você veio, repetindo o aceno onze vezes. Sabes que te quero, andorinha.

Preferes as cobertas do que meu karaokê de sílabas, de baixo teor calórico.

Gosto quando você para de papo furado e me tira para DANÇAR

Você sozinha pensando. Desenhei alguma coisa.

Quebre o gelo. Pouse em meu sonho.

Amor é vermelho, não disfarça nunca.

Todo meu olhar te pertence.

Penso o tempo todo em ti porque estás longe. Preciso de ti ao meu lado para pensar em outra coisa

Partiste para a sutil defesa. O torcicolo contra o cheiro, o cinto prevenindo o encosto, a manta escondendo o seio. Te guardas para mais tarde, quando ninguém estiver vendo.

Teu rosto mudou, foi o exercício. O amor machucou só pelo vício

Troco a dor por duas pétalas. Passe o mel no canteiro obsoleto.


VANGUARDA

O que foi vanguarda hoje é altar-mor. O enterro do poema no suicídio do verbo. Mas não há retorno, o abismo é sempre o próximo passo.

Quebro a pedra da palavra. Reparto o repasto da obra. Volto para a fonte fora da paisagem. Resta a letra torta, trilha rota no paredão concreto.

Por que estou aqui te falando? Deveria estar no front, fazendo coisas. Mas me recomponho. Volto para a batalha enquanto cultivo a flor que desabrocha cedo.

Amor mal acostuma. É tão forte que abusamos. Achamos que podemos esquecê-lo na chuva que não ficará doente.

Tínhamos mais o que fazer. Ganhar a vida, salvar o mundo. O amor ficou para depois, se fingindo de morto.

Acordei contigo me perguntando o nome. Era o que faltava para fechar a noite.

Comigo será sempre assim. De manhã um verso, à noite uma surpresa. Se não quiser, basta mudar de telefone.

Não tem mais graça querer-te. Achas que é rotina. Vais em busca da incerteza. Depois não volte para pegar o lenço esquecido sobre a cama.

Bateu o vento de frente. Trouxe teu rosto rente. Dobrei os joelhos quando o clima ameaçou o beijo.

Reli nossas cartas. O amor é o único álibi convincente da bobagem.

Já vi tudo: olhar comprido, vestido curto.

Leve consigo o recado dos deuses. Eles falam em código, por sinais dispersos. Junte-os no poema

Tão frio que chamei a ambulância, teu corpo em chamas.



RETRNO - Imagem desta edição: obra de Manet.