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8 de junho de 2012

NEVE


Nei Duclós

Minhas palavras se encolhem e vão se abrigar no teu ouvido.

Adoras o fogo. Aquele longo, que dura. O que provoca sardas no rosto. Quando teu corpo sua, mesmo que a neve nos cubra.

Escrevi dez milhões de versos porque temi o domínio do deserto.

Quando quiseram dar o golpe final viram que a poesia tinha criado raízes no coração outrora seco da nação que existe em teu peito.

O frio só tem uma solução: o calor que vem do que me dizes, coração.

Nossos corpos levam alguns segundos para o encaixe perfeito. Depois não há mais conserto.

Há barulhos na hora do embate. O silêncio vem depois, quando a Lua espicha o ouvido para nos escutar.

É só palavra, reclamas. Fato. Agora dispa esse ombro de sonho.

Busco o verbo menos representado na literatura da tua pele. Maneira de te pegar de jeito, rompendo o que parece incólume enquanto arranhas o poder do meu compasso.

Não queria essas palavras viciadas como sumo, mas é disso que se trata. Meu olho rútilo e a mão bruta pousando no chão úmido da tua alma.

Agora vamos direto ao ponto: desarme-se para o beijo e não invoque o frio para tanta roupa.

Lua cheia de poesia, teu coração que inaugura a noite em que estamos juntos, sonho varrido de altura do amor que tenho por ti, minha deusa.

Quero a Lua cheia de dia, namorando o céu azul, já que de noite há o ciúme da nuvem que a mantém escondida.

Tinhas razão, era só fantasia. Agora dá licença que vou continuar sonhando.

Fomos ao concerto ao ar livre. Desmaiaste em meu colo. Os acordes viraram fadas ao redor do teu sono. Sonhavas com Deus e tinhas sede. Te dei um beijo, molhada.

Fechaste todas as portas. De vez em quando não resistes e me acenas, porque és minha.

Não faço cerimônia quando te pego. Admirável que não acuses o golpe. És uma rocha que minha ressaca fustiga. Mas respingo em teu rosto coroado de pássaros.

Vieste em socorro da natureza. Tudo secou, menos a revoada do teu coração.

A Cheia continua oculta.Vai passar em brancas nuvens.

O que devemos lamentar mesmo nesta noite de inverno é não ter a Lua cheia para olhar, com tanta nuvem.

Não sofra se algum dia eu for embora. Depois de ti só há um caminho, a volta.



RETORNO – Imagem desta edição: Emily Blunt.