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11 de janeiro de 2012

FONTE


Nei Duclós

Quando todos calam, poesia é não parar de dizer

Poema nasce de uma fonte que não se contamina. Nem com teu verbo em fúria

Destruíram a memória, fonte da cultura. Manipularam o tempo. Esqueceram a poesia por desprezá-la. Foi quando a palavra sobrevivente veio do levante

A cidade foi receber o poema que cruzou o deserto. Beba da minha água, diziam para o peregrino. Mas ele aceitou apenas o mel do teu sorriso

Os amores são colares que se rompem. Na ponta dos pés colho contas no chão veloz do tempo

Minha face oculta é o silêncio que você pensa que é medo. Meu medo oculto é o segredo que você guarda no espelho

Perseguimos o sol, mas somos sombras e precisamos saber onde se esconde a verdadeira flor, a que não sonha nos cadernos rotos desta trama

Eu não me ajoelho para a mulher que eu amo. Eu amo a mulher que me põe de joelhos

Voltei ao normal, minha flor. Esqueci de mim para morar no teu coração

Só falta me dizer onde estás. Assim posso colocar um pingo luminoso no mapa da minha saudade

Já era tarde quando acordei para tua ausência. Corri até a estação e o trem pegava a curva. Voei então depois de dizer shazam

Fizemos fogo para a noite alta. Da fricção à labareda e depois a brasa. Por todo o tempo, fagulhas salpicavam o ar da madrugada: teus beijos

Não te feri, peregrina. Escolheste o caminho e compartilhamos. Traço meu rumo, sou cigano

Não coloque ninguém contra a imagem partida do teu sonho. É pior

Não tente seduzir a paixão para teu deserto. Não sobrevive

Só toco o teclado. Ficas intacta

A verdade dói em quem diz

Me matas, ausente. Esse é teu objetivo

O universo partiu-se na cabeça. Ceguei-me em sangue de estrelas e molhei o travesseiro onde guardava segredos. A vida é um passo além do extremo

Quietinha, me escutas. Falo demais e agora compartilho do silêncio. Dá para ouvir as pombas no telhado do mundo. O dia toma impulso, garoa

É vício, releve. Não consigo fazer diferente. Mas deixo tudo quando me acenas. Então fico contigo até que o século se espatife


RETORNO – Imagem desta edição: obra de Eugene de Blaas

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