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24 de junho de 2011
ESTAÇÕES DO AMOR E DA MEMÓRIA
Nei Duclós
Levei pouca coisa. Uma flâmula do colégio.Um livro emprestado. Dois cadernos em espiral meio preenchidos. E teu retrato, sépia de tanto amor
No fundo, não levamos nada, apenas um coração e algumas palavras
Já era hora, disse o anjo. Olhei para trás pela última vez. Lá estava meu tambor, ainda intacto, aceitando o som que lhe fazia o vento
Não tem valor o que me dizes, avisou o mensageiro dos plenos poderes. Deixe de despedidas e volte para o que te pertence e não nos interessa
O navio te espera até o último aviso. Depois levanta âncora, onde se dependuram duendes, que cruzam o mar em busca de sereias
E porque o sr. vai se mudar? perguntou a vizinha. Foi a Lua, respondi. Reclamou que não conseguia se ver mais no espelho riscado do meu sono
“O pessoal do conserto está aí", me disseram. Mostrei então problema: poemas vazavam do sótão e as palavras se acumulavam no corredor
"E o que o sr. vai fazer com estas memórias?" perguntou o encarregado da mudança. "Deixa na calçada", respondi. "Há de ter alguém que leve"
São apenas pássaros, disse o pai para meus ouvidos assustados. O pior ainda está por vir, quando o Tempo estender um lençol sobre as árvores
Depois de desfilar, tirei o uniforme e fui ver a beira barrenta do rio. Lá fiquei por toda a eternidade
DE MÃOS DADAS
Treinamos o andar de mãos dadas, antes de estrearmos na manhã de inverno. Fizemos bonito, você de manta vermelha e um sorriso escancarado
Era o amor e eu achei que seria assim o tempo inteiro. Mas vieram os intervalos, quando saímos por qualquer motivo e esquecemos de voltar
Agora você não pode adiar mais, disse ela. Cansei de amar sem companhia. Pegue o próximo trem, que vou inaugurar só para a tua viagem
RETORNO - Imagem desta edição: cena de Oito e Meio, de Fellini.
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