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25 de janeiro de 2011

MEMÓRIAS


Nei Duclós

Tudo o que nos impressiona, passa. Varrendo antigas mensagens digitais, redescubro a intensidade da fé em inúmeros eventos, sobre os quais nos debruçamos por anos e que acabaram num canto, como pó esquecido pela vassoura gasta. Uma dessas obsessões foi o reconhecimento público pelo trabalho desenvolvido ao longo da vida. Não que a indiferença tenha nos machucado, mas sim porque perdemos aquela força que nos fazia acenar de um barco em alto mar para cruzeiros distantes.

Outro foram as datas aguardadas como grandes reviravoltas. Essas realmente aconteceram, mas, surpresa geral, tudo continuou praticamente o mesmo. A mudança não foi como imaginada. Raspou-se a superfície dos fatos, mas permaneceu o mergulho ancestral do iceberg em rota de colisão. E prestando bem atenção, nem mesmo o que está mais explícito e visível se transformou de verdade. Por mais maquiada que seja a realidade, as chuvas de verão se encarregam de colocar tudo abaixo, revelando os ossos de estruturas esquecidas.

Vimos o que aconteceu na hecatombe da serra fluminense. Sem os aparatos para jogar poeira nos olhos da percepção coletiva, emergiu a base das comunidades: o Brasil colônia! Pois o que vimos eram a pá e os carrinhos-de-mão arrostando barro ou capinando a morte, a necessidade de velas e fósforos, e o veículo mais antigo de nossa nacionalidade, o porrete atravessando uma lona para levar mortos e feridos. Como não há mais esperança de recuperar corpos em vários trechos remotos da grande área atingida, fica a terra abrigando o resultado dessa ilusão que é a mudança célere para o futuro, quando estamos firmemente ancorados no passado.

É o coração que insiste em ficar para trás. Enquanto a mente viaja para futuros bizarros, sentimos que ainda pulsa o sol brilhando entre pedras lisas no quintal. As pipas sobrevivem, não mais inocentes pois, muitas vezes, servem de álibi para comportamentos invasivos atraídos para o furto. Mas elas giram no ar como o aceno referido em que tentávamos chamar a atenção dos contemporâneos. Como ninguém dá bola, e existe vento travesso, ela acaba descendo em espiral ou se enredando nos fios.

É o que acontece com nossa memória, essa vida pregressa que nos assombra com seus funerais de palavras recolhidas como lixo.

RETORNO - 1. Imagem desta edição: tirei daqui. 2. Crônica publicada nesta terça-feira, dia 25 de janeiro de 2011 ,no caderno Variedades, do Diário Catarinense.

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