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2 de abril de 2010

DOURADO E A LEI DO MAIS FORTE DA FALSA CIDADANIA



A Rede Globo precisa definir parâmetros de comportamento que sirvam para influir nos consumidores das porcarias que difunde em suas campanhas milionárias. Carros que andam em avenidas vazias nos filmecos entopem as cidades de infra-estrutura podre: essa é a situação do país do Ibope de cartas marcadas, em que a popularidade do chefe do governo atinge o patamar dos ditadores, em que não há possibilidade de defecção. Qual seria o paradigma do idiota que consome ilusões perversas? O saradão ágrafo e preconceituoso, o boquirroto que exibe cretinicie confundida com “atitude”, a palavra da moda.

Atitude é marca notória de um jovem americano que resolveu vender camisetas. A palavra certa na hora certa serviu para seu sucesso. Agora serve para definir o código de conduta da selva brasileira, onde impera a lei do mais forte. Não há lugar para fracos e perdedores, a não ser como platéia e massa de manobra para gastar a péssima remuneração da sua mais valia em caríssimos produtos feitos para estragar. Ao premiar o fortão que berra contra homossexuais e dá exemplos notórios de falta de compostura, a Rede Globo avisa que é assim que a coisa funciona: quem é mais forte pode e agüenta quem tem juízo.

Como pode uma sujeição dessas ser celebrada nas ruas como um grande acontecimento do noticiário, ou seja, como pode uma falcatrua desse quilate ser confundida com notícia? É preciso, para isso, que haja a imposição de uma rede de transmissão que pega até a mil metros abaixo do solo, nas catacumbas da floresta. O sinal chega perfeito ao grotão e impera nas cidades, deixando um pouco para as outras redes para manter o aspecto de concorrência.

A Globo, como o capital especulativo que a sustenta, tem horror à concorrência. Toda vez que uma outra rede revela um sucesso, a Globo vai lá e compra. Se for um evento, como o Oscar, tantos anos no SBT, ela não permite, paga mais. Se existir uma novela de grande impacto, como Pantanal, da velha Manchete, ela se serve de tudo, de atores a diretores. No cinema, quando há novidades na estética ou na interpretação, ela vai lá e pega. E depois impõe seus filmes produzidos com dinheiro público para que nem o cinema lhe faça concorrência. No esporte é um espanto: tudo é dela. A Globo é a lei do mais forte.

Mas como disfarçar tamanha sacanagem? É preciso gerar um novo sistema de valores. Além da atitude, do se impor não importa a quem, é preciso que as pessoas acreditem nas suas denúncias, que obedecem aos interesses da rede. Adversários políticos são enxovalhados em público, como aconteceu como Leonel Brizola. No sistema de valores do chamado politicamente correto, a Globo pega os princípios da falsa cidadania, em que os consumidores, confundidos com cidadãos, repetem as falas introduzidas pelos próprios repórteres. “Não dá mais para agüentar?” diz o repórter. “Não dá mais para agüentar”, repete a voz do povo-fala. O pior é o povo-fala com script, como aconteceu com as falsas entrevistas do Bigbrother.

Quando algo poderoso, criado fora do Brasil, claro, como a internet começa a abrigar e a difundir oposição séria à rede Globo, desviando a atenção da opinião pública para enfoques diferentes dos disseminados pelo monopólio, é hora de entrar em ação: forjar uma premiação do William Bonner no Twitter (que gracinha!), fazer a rede coadjuvante do noticiário (“Veja na nossa página da internet a tralha que não acabe aqui, no nosso espaço milionário”) ou mesmo chamar os internautas pelo primeiro nome, já que assim eles se confundem com o Zé da Couves sem sobrenome nem voz verdadeira, para dar pitacos em transmissões esportivas.

Essa é a lei do cão a qual somos submetidos. Vejo agora os saradões muito mais à vontade nos seu carrões e motos, nos supermercados e ruas, em cervejadas expostas no passeio público, mexendo com todo mundo, tomando “atitudes”. Eles estão bem representados pelo vencedor do programa sinistro que precisou pegar emprestado a credibilidade de um bom jornalista que acabou sucumbindo à tentação de ser uma ilusão do entretenimento, a de encarnar o Chacrinha, aquele herói da “Comunicação (“Quem não se comunica se trumbica”.) Cruzando o jornalista com o performer, num ambiente em que o jornalismo foi substituído pela tal Comunicação, a Globo oferece ao público a representação de sua própria natureza, a lei do mais forte da falsa cidadania.

Pedro Bial não é o problema, ele está lá apenas amealhando popularidade e será descartado quando o esquema parar de dar dinheiro. O problema é o sistema que está por trás dele e que parece indestrutível. Ficará mesmo mil anos entre nós essa ditadura da lei do cão se ninguém se insurgir de verdade. Até quem trabalha na Globo precisa que haja oposição. Não para manter a aparência da democracia. Mas porque é um pesadelo viver indefinidamente num monstro que a tudo devora porque todos se recolheram às suas casas, amuados, com medo de retaliações.

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