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11 de novembro de 2009
A LÓGICA DO APAGÃO
Quando a luz some em trezentos estados brasileiros e o sistema de Itaipu pára de transmitir energia completamente pela primeira vez na História, você, meu caro jornalista, não vai entrevistar o cachorrinho. Não caia na asneira de aparecer no ar dizendo: “E aí, cachorrinho, por que houve o apagão?” Au, au, responde o canino. Não perca tempo também fotografando happy hour à luz de velas, porque isso é óbvio, não desperdice o espaço da mídia que tens na mão.
Você simplesmente deixa de lado o jornalista como protagonista, deixe de filmar jornalista na estrada escura, esquece o assessor de imprensa das usinas e pergunta, sim pergunta, exerce esse hábito obsoleto, para um técnico, para alguém especializado na área, um engenheiro, lembram-se? Pergunte assim: por que houve o apagão? Aí o engenheiro responde. É assim que funciona. Leia a explicação:
“É apagão por garantia do sistema. Quando cai uma linha importante, por qualquer razão (até tiro costumam dar nos isoladores), ela tira uma quantidade de geração do sistema. Então a geração que sobra, que está ligada ao sistema (nós, com nosso consumo doido de eletricidade, numa hora de uso pesado como as 17 horas) não agüenta e solicita mais geração. Automaticamente as unidades geradoras vão gerando mais. Mas como é insuficiente, antes que aconteça alguma coisa ruim com todo parque gerador, as usinas são desligadas automaticamente.”
“Claro que este método de alívio de carga é por etapas. Como resultado, além daquela parte de geração que caiu, pela queda da linha, boa parte do parque gerador vai se desligando, causando uma falta de energia numa região pequena ou grande. Como o que caiu foram as linhas de Itaipu, o sistema perdeu seu maior parque gerador. Isso nunca tinha acontecido. Para repor Itaipu, não tem facilidade, nem quantidade de geração.”
“Pergunto: e essa quantidade de térmica a gás, diesel etc que colocaram a gerar, mina de ouro de uns e outros, porque elas não entraram para suprir a falta de Itaipu? Porque são de uns e outros. Depois vem o pior, para recompor, como? Se toda a carga (nós que mantemos as luzes a mil, a geladeira, a TV etc.) está ligada, não se consegue ligar usina por usina, pois a carga é grande, tem que começar uma recomposição lenta a partir de uma usina e um sistema isolado, que depois vai se ligando as outras usinas, ao sistema parcialmente. Leva um bom tempo esta reconexão.”
“Tem proteção automática que desliga se algo não agüentar a carga (nós). É como carro que atola. Isso aí, acontece. Quanto maior o acidente - e Itaipu é a maior em geração, quantidade de energia gerada, no mundo – mais difícil fica. Apagaria em qualquer país. Às vezes este efeito dominó começa em problema em uma usina grande que, por atuação das proteções, para as máquinas. Falta energia - não fale em luz elétrica , gostam tanto de falar em energia do ching yang cu que esquecem de dizer energia elétrica. Este não foi por falta de oferta de energia, foi um tropeção, que desequilibrou tudo. A gente derruba um lutador de peso com um golpe de sorte aplicado num lugar inusitado. Não é hacker, acontece. O sistema é seguro, Itaipu gera há 20 anos, nunca saiu assim.”
"Duas perguntas podem ser feitas. Se o problema que tirou as linhas de Itaipu foi tão sério, onde estão os estragos? Não tem foto, não tem localização, nada. Como se pode recompor com as mesmas linhas (são 8 de 750 KV – estas são da toda poderosa Furnas, recém tomada pelo PMDB do Sarney) que sofreram uma avaria tão séria? E não deixar vestígio? E porque não se falou da conversora de corrente alternada em contínua das unidades de Itaipu? Em Itaipu, metade das unidades são em 50 ciclos por segundo (50 Hz), energia que é convertida em Corrente Contínua, e transportada até Tijuco Preto, SP, onde voltam a ser convertida em corrente alternada. Pode ter sido simplesmente barbeiragem dos novos donos de Furnas.”
“Os paraguaios querem uma reunião Brasil, Paraguai e Argentina para analisar o problema. Falam em curto circuito que foi se alastrando. Vão pedir indenização! O assunto é técnico, mas a ignorância leva para estes lados obscuros.”
Entenderam? Se não entenderem, perguntem para engenheiros. Exerçam o jornalismo, essa profissão em desuso. Não entrevistem políticos, ministros, cachorrinhos. Entrevistem engenheiros especialistas. Não filmem gente chorando! Trabalhem! Senão, o editor vai dar uns cascudos em vocês, viu? Vai tirar vocês do ar, tão seguradores de microfones perguntando como é essa coisa de, gente do céu! ter apagão. Haja.
O que mais irrita é essa cara de boi compungido dos apresentadores, todos contra o câncer, a deitar falação politicamente correta, "lamentando o ocorrido" e "fazendo votos" para que não aconteça mais. Jornalista não é comadre, não tem que ficar lamentando ou fazendo votos. Parece que todo mundo é candidato. Ninguém vai ficar preocupado se você, caro jornalista, não se declarar tão chocado com os fatos. Ao contrário. Deixe que os leitores e espectadores se choquem ou não, conforme vão tomando conhecimento dos fatos com a ajuda do jornalismo. Ninguém quer ficar de olho parado diante da realidade dizendo "puxa, puxa". As pessoas querem saber o que realmente acontece, só isso.
RETORNO - Pois foi a Ana Maria Braga fazer o básico - entrevistar um especialista - para ser interrompida pelo trator Sandra Annenberg.A fonte falava da necessidade de investir em linhas de transmissão, em gestão e política de segurança para o setor e quando chegava ao ponto a Braga interrompia. Mas pelo menos a entrevista estava se segurando, até acabar nas garras da Sandrona, da soberba, da mediocridade, do atropelo, da ânsia de aparecer de quem deveria se preocupar mais com a informação do que com o circo.
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