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3 de outubro de 2009
PARADIGMAS EM “CARAS E BOCAS”
Como novela é considerada perda de tempo, e é verdade, já que substitui atividades mais proveitosas, como ler livros importantes, ver filmes antológicos, criar alguma coisa, vou elencar em itens o que vejo nessa “obra” escrita por Walcir Carrasco e dirigida por Jorge Fernando. Os paradigmas insuflados pela novela são estes, muito bem expostos e repisados na trama:
1. O marido corno é, no fundo, homossexual, pois se traveste de gueixa, baiana, perua, para tentar flagrar a mulher com o falso irmão, colocado pela mulher dentro de casa sob o álibi de ser da família, quando não passa de amante. Está na cara de todo mundo, menos do maridão enrustido, que não perde ocasião de colocar uma saia. Talvez ele já esteja convencido da sua homossexualidade, apenas usa o relacionamento dos dois para se vestir de mulherzinha, que é, no fundo, o que sempre desejou.
2. O garoto bobão é, no fundo homossexual, por isso aceita ser vestido de mulherzinha para agradar seu pretenso objeto de desejo, a garota arrivista e pragmática, que faz dele gasto e sapato. Os gestos atrapalhados, a gagueira, o jeito meio afrescalhado sugerem que ele pode servir de divertimento para homossexuais adultos que estão no poder na novela e gostam de ver adolescente usando saia florida.
3. O marido da vilã dominadora é, no fundo, homossexual, pois é destratado pela mulher de todas as maneiras e nem quando sabe do caso que ela tem com seu assessor deixa de ser o bobalhão que é. Não toma atitude, não rompe, fica sempre à mercê das ordens dela, como o filho homossexual dominado pela mãe castradora.
4. O “bofe escândalo”, amante da perua passadaça, é explicitamente homossexual, mas surpreende com o relacionamento hetero, apesar de a toda hora ter recaídas, quando toca em algum galã ou suspira diante de homens considerados, pelos mandões da novela, bonitos (são apresentados como irresistíveis).
5. A heterossexualidade é contaminada pela desconfiança, a chantagem, o ódio mútuo ou pelo esforço chato e inútil de gerar uma criança. Ou simplesmente nojenta, como acontece com o mau-caráter que a todas seduz com sua lábia, como a provar que relacionamento com mulher é sempre suspeito. Em contraponto, a homossexualidade é lúdica, bizarra, circense, ingênua e amorosa e atinge a maioria dos personagens, à revelia deles ou não. Os dois funcionários do bar (que chamam o galã de “patrãozinho”) estão sempre de avental brincando de se pegar; o amante e o marido da baiana são flagrados por ela abraçados na cama.
6. Todos estão á venda, vítimas da garota ambiciosa que compra e chantageia todo mundo, da vilã que quer dirigir a grande empresa, do executivo gordo e canalha que a toda hora dá um golpe. Os amigos traem, as ex-mulheres sacaneiam, a apaixonada compra o marido por meio de um contrato draconiano, a enfermeira é uma espiã, o assessor é bandido, o pintor falsifica, os namorados mentem, o avô manipula.
7. A arte e os artistas não prestam. Quadros modernos podem ser feitos por macacos. Basta jogar uns baldes de tinta nas telas e dar umas pinceladas a esmo, aos guinchos. Isso deslumbra o mercado de arte, feito por babacas idiotas e cheios da grana.
Chega? “Não tem nenhuma”, como costumam dizer. Isso é inoculado para milhões de pessoas, todos os dias, de maneira divertida. É tão gostoso deixar-se levar pela baixaria! Solidariedade, talento, seriedade, grandeza, tudo isso não vale nada. São princípios perigosos. Se estivessem em vigor no país, a mediocridade criminosa não tomaria o poder para sempre, como aconteceu no Brasil.
RETORNO - Imagem desta edição: o ator Marco Pigossi, no papel do marido corno, se traveste de Cupido.
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